sexta-feira, julho 31, 2009

Linha cruzada





Governo federal endurece com empresas de telefonia, mas também contribuiu para agravar problemas do setor

APÓS SUCESSIVAS medidas para esvaziar a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), o governo federal finalmente dá um passo em direção ao bom senso na tentativa de sanar os graves problemas que se acumulam na prestação de serviços de telefonia e acesso à internet no país. O Ministério da Justiça sinaliza endurecimento na fiscalização e punição de empresas que já tenham recebido uma grande quantidade de multas mas não apresentaram soluções para os problemas apontados.

Relatório elaborado pela pasta mostra que um terço das reclamações aos Procons se deve a serviços de telecomunicações -fixa, móvel, aparelhos, internet e TV por assinatura. É o setor que concentra a maior proporção de queixas. Os principais motivos de insatisfação são cobrança indevida, relutância em cancelar ou alterar serviço e dificuldade de obter assistência ou troca de aparelhos defeituosos.
O levantamento, que enfoca o período de maio de 2005 a abril deste ano, revela que não houve mudança na natureza das reclamações nesse intervalo. A conclusão oficial é que as empresas decidiram arcar com os custos das multas e não investir na resolução das falhas.

O SNDC (Sistema Nacional de Defesa do Consumidor), coordenado pelo ministério, protocolou duas ações na Justiça Federal, cobrando R$ 300 milhões das empresas Oi e da Claro a título de danos morais coletivos, devido ao mau atendimento prestado pelos call centers dessas operadoras. As empresas afirmam que estão investindo para melhorar.

A parca eficiência da Anatel na resolução de problemas primários é gritante. Basta lembrar que foram necessárias quatro panes da Telefônica para que a agência decidisse, no mês passado, tomar medidas mais rigorosas em defesa do consumidor.

Em parte, diga-se, a inoperância da Anatel está ligada ao desmonte orquestrado pelo próprio Planalto -desde a pressão que resultou na saída do então presidente Luiz Guilherme Shymura, por divergências sobre reajuste de tarifas, à portaria que transferiu para a Advocacia Geral da União, órgão da Presidência, o poder que as agências reguladoras tinham de sustentar decisões perante tribunais superiores.

Escândalos e decisões duvidosas também têm marcado a relação do governo Lula com o setor. O exemplo mais clamoroso foi a intervenção do Planalto na mudança de regras para permitir a fusão da Brasil Telecom e da Oi, oligopólio concretizado com financiamento do BNDES e do Banco do Brasil.

Os benefícios trazidos pela privatização da telefonia no país são inegáveis, a começar pela expansão e popularização. Mas a garantia de que as empresas ofereçam serviços de qualidade a preços justos não pode ser negligenciada, como tem sido, pelas autoridades. Sem uma vigilância maior, corre-se o risco de as operadoras perpetuarem um modelo de atendimento no qual "se lixar" para a sociedade, como está em voga no país, é um dos traços mais criticáveis.

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