quarta-feira, novembro 05, 2008

Discurso de Malcolm X no Corn Hill Methodist Church

Carta O Berro

16 de fevereiro de 1965.

Corn Hill Methodist Church, Rochester

Não apenas um problema Americano,

mas um problema mundial.

Livro: February 1965 - The Final Speeches Malcolm X

Editora: Pathfinder

Editado por: Steve Clark

Ano: 1992

Páginas: 143-170

Notas: págs. 281-282

Traduzido por Paulo Luiz Rodrigues

Entre julho e agosto de 2008.

Em 16 de fevereiro, Malcolm X voou para Rochester, Nova York. Durante a tarde, ele manteve uma conversa com a imprensa no Manger Hotel. De acordo com as informações prestadas, ele pediu "uma sociedade na qual todos possam viver como seres humanos," independentemente da cor de suas peles. "Vocês descobrirão que [negros e brancos] eventualmente se encontrarão na parte mais baixa da estrada". Ele chamou a situação dos Negros na América "pior do que era dez anos atrás[79]". Mais tarde nesse dia, ele falou no Colgate Rochester Divinity School.

No anoitecer, Malcolm dirigiu-se para a reunião marcada no Corn Hill Methodist Church. O texto desse discurso, impresso abaixo, é transcrito da gravação.

Primeiro, irmãos e irmãs, eu quero começar agradecendo a vocês por tirarem um tempo para saírem nesse entardecer e especialmente pelo convite para eu subir a Rochester e participar desta pequena discussão informal neste entardecer sobre problemas que são de interesse comum para todos os membros na comunidade, na comunidade Rochester inteira[80]. E minha razão por estar aqui é discutir a revolução Negra que está acontecendo, que está tomando lugar nesta terra, a maneira pela qual está tomando lugar no continente Africano, e o impacto que está tendo nas comunidades Negras e não apenas aqui na América, mas na Inglaterra e na França e em outros das ex-colônias.

Muitos de vocês provavelmente leram na última semana que eu fiz um esforço para ir para Paris e fui mandado embora. E Paris não manda ninguém embora. Vocês sabem, ninguém suposto de ser capaz de ir para a França, lá é suposto ser um lugar muito liberal. Mas a França está tendo problemas hoje que não tinham sido publicizadas grandemente. E a Inglaterra está também tendo problemas que não tinham sido publicizados grandemente, porque os problemas da América tinham sido então publicizados grandemente. Mas todos estes três parceiros, ou aliados, têm problemas em comum hoje que o Negro americano, ou Afro-americano, não está suficientemente fluido nisso.

Em ordem para vocês e eu sabermos a natureza da luta em que vocês e eu estamos envolvidos, nós temos não só que conhecer os vários ingredientes envolvidos nos níveis locais e nacionais. E os problemas do homem negro aqui neste país pararam de ser um problema apenas do Negro americano ou um problema americano. Ele tornou-se um problema que é tão complexo e tem tantas implicações nele, que vocês têm que estudá-lo no contexto mundial ou em seu contexto internacional, para vê-lo como atualmente é. Por outro lado vocês não podem mesmo seguir o discurso local, a menos que vocês saibam que porção ele desempenha no contexto internacional inteiro. E quando vocês olharem-no neste contexto, verão com mais claridade.

E vocês deveriam perguntar a vocês mesmos por que deveria um país como a França estar tão preocupado com um insignificante Negro Americano que eles proibiram-no de entrar lá, quando quase ninguém mais pode ir àquele país quando deseja. Isso inicialmente porque os três países têm o mesmo problema. E o problema é este: que no Hemisfério Oeste, vocês e eu não compreendemos isto, mas nós somos exatamente uma minoria nesta terra. No Hemisfério Oeste há – as pessoas no Brasil, dois terços das pessoas no Brasil são pessoas de pele escura, a mesma como vocês e eu. Elas são pessoas de origem Africana, ancestrais africanos, retaguarda africana. E não apenas no Brasil, mas através de toda a América Latina, o Caribe, os Estados Unidos, e o Canadá, vocês têm pessoas que são de origem Africana.

Muitos de nós nos enganamos em pensar Afro-americanos apenas quem está aqui nos Estados Unidos. América é América do Norte, América Central, e América do Sul. Qualquer um com ancestral Africano na América do Sul é um Afro-americano. Qualquer um na América Central de sangue Africano é um Afro-americano. Qualquer um aqui na América do Norte, incluindo o Canadá, é um Afro-americano se ele tiver ancestral Africano – mesmo abaixo no Caribe, ele é um Afro-americano. Então, quando eu falo de Afro-americanos, eu não estou falando apenas dos vinte e dois milhões de nós que estamos aqui nos Estados Unidos. Mas o Afro-americano é este grande número de pessoas no Hemisfério Oeste, das extremidades mais ao sul da América do Sul às extremidades mais ao norte da América do Norte, os quais todos temos uma herança comum e temos uma origem comum quando vocês voltam na história destas pessoas.

Agora, há quatro esferas de influência no Hemisfério Oeste, onde pessoas Negras estão envolvidas. Há a influência Espanhola, a qual significa que a Espanha primeiramente colonizou certa área do Hemisfério Oeste. Há a esfera de influência da França, a qual significa aquelas áreas que ela colonizou primeiramente. A área que a Inglaterra colonizou primeiramente. E então estas nossas que são os Estados Unidos.

A área que foi inicialmente colonizada pelos espanhóis é comumente referida como América Latina. Lá a maioria das pessoas tem pele escura, de ancestralidade Africana. A área que a França colonizou aqui no Hemisfério Oeste é largamente referida como Índia Oeste Francesa. E a área que a Inglaterra colonizou são estas que são comumente referidas como Índia Oeste Inglesa, e também Canadá. E então novamente, há os Estados Unidos. Então, nós temos estas quatro classificações diferentes de povo Negro, ou povo não-branco, aqui no Hemisfério Oeste.

Por causa da economia pobre da Espanha, e porque ela parou de ser uma influência sobre o cenário mundial como era inicialmente, não muitas das pessoas de pele negra da esfera de influência espanhola migraram para a Espanha. Mas por causa do alto padrão de vida na França e Inglaterra, vocês descobrem que muitas das pessoas negras da Índia Oeste Inglesa estão migrando para a Inglaterra, muitas das pessoas negras da Índia Oeste Francesa migram para a frança, e, então, vocês e eu já estamos aqui.

Então isto significa que os três maiores aliados, Estados Unidos, Inglaterra e França, têm um problema hoje que é um problema comum. Mas vocês e eu nunca estamos dando informações suficientes para compreender que eles têm um problema comum. E que problema comum é o novo modo como é refletido em qualquer modelo de comportamento das pessoas negras do continente Francês, com a mesma esfera da Inglaterra, e também aqui nos Estados Unidos. E este modo está mudando no mesmo grau que o modo sobre o continente Africano tem mudado. E quando descobrirem que a revolução Africana tomou lugar – e por revolução Africana eu quero dizer a emergência das nações Africanas para a independência – isto que está acontecendo por dez ou doze anos atrás, afetou absolutamente o modo das pessoas negras no Hemisfério Oeste. Tanto mais que quando elas migram para a Inglaterra, elas representam um problema para os ingleses. E quando elas migram para a França, elas apresentam um problema para os franceses. E quando elas – já aqui nos Estados Unidos – mas quando elas são despertadas, e este mesmo modo é refletido no homem negro nos Estados Unidos, estão apresenta um problema para o homem branco aqui na América.

E não pensem vocês que o problema que o homem branco tem na América é único. A França tem o mesmo problema. E a Inglaterra está tendo o mesmo problema. Mas a única diferença entre o problema na França e Inglaterra, e aqui: há muitos líderes negros que têm se rebelado aqui no Hemisfério Oeste, nos Estados Unidos, que têm criado muito mais um espírito de militância que tem assustado os americanos bancos, mas isto tem estado ausente na França e na Inglaterra. E isto tem sido apenas recentemente que a Comunidade Negra Americana e a Comunidade Indiana Francesa Oeste, junto com a Comunidade Africana na França, têm começado a organizar-se entre eles mesmos, e está assustando a França de morte. E as mesmas coisas estão acontecendo na Inglaterra. Até recentemente eles eram desorganizados completamente. Mas recentemente os Indianos Oeste na Inglaterra, juntos co a Comunidade Africana na Inglaterra, juntos com Asiáticos na Inglaterra, começaram a organizar e a trabalhar em coordenação um com o outro, em conjunção um com o outro. E isto tem apresentado um problema muito sério para a Inglaterra.

Então, eu tenho que dar a vocês este pano de fundo, para vocês entenderem um pouco sobre os problemas correntes que estão se desenvolvendo aqui nesta terra. E muito depressa vocês podem entender os problemas entre pessoas negras e brancas aqui em Rochester ou pessoas negras e brancas no Mississipi ou pessoas negras e brancas na Califórnia, a menos que vocês entendam o problema básico que existe entre pessoas negras e brancas não limitadas no nível local, mas confinadas no internacional, nível global sobre esta terra hoje. Quando vocês olharem o contexto, vocês entenderão isto. Mas se vocês apenas tentarem e olharem no contexto local, vocês nunca entenderão isto. Vocês têm que ver a tendência que está tomando lugar sobre a terra. E meu propósito ao vir aqui esta noite é tentar e dar a vocês, como atualização, um entendimento de como isso tudo é possível.

Como muitos de vocês sabem, eu saí do movimento Muçulmano Negro e durante os meses do verão, eu passei cinco daqueles meses no Meio Oeste e no continente Africano, durante este tempo eu visitei muitos países, o primeiro dos quais foi o Egito, e depois a Arábia, depois Kuwait, Líbano, Sudão, Quênia, Etiópia, Zanzibar, Tanganyika – que agora é Tanzânia -, Nigéria, Gana, Guiné, Libéria, Algeria. E então nos cinco meses que eu estive fora eu tive oportunidade de manter longas discussões com o Presidente Nasser, no Egito; Presidente Julius Nyerere, na Tanzânia; Jomo Kenyatta, no Quênia; Milton Obote, em Uganda; Azikiwe, na Nigéria; Nkrumak, em Gana; e Sékou Touré, na Guiné.

E durante as conversações com estes homens, e outros africanos daquele continente, houve muita troca de informação que ampliaram meu entendimento e, sinto, ampliaram meu alcance. Então, desde que voltei de lá, eu não tive seja que desejo de avançar em qualquer argumento trivial com pessoas de inteligência de passarinho ou memória curta que por acaso pertencem a organizações, baseadas em fatos que estão mal encaminhados e não levam vocês a lugar algum quando vocês têm problemas tão complexos como os nossos que estamos tentando resolver.

Então, eu não estou aqui esta noite para falar sobre alguns desses movimentos que estão se chocando uns como outros. Eu estou aqui para falar sobre os problemas que estão em frente de todos nós. E fazer isso de um modo muito informal. Eu nunca gostei de estar preso a método formal ou procedimento quando falo para um auditório, porque eu descobri que normalmente a conversa que eu estou envolvido em refletir em torno de raça, ou coisa racial, que não é minha imperfeição. Eu não criei o problema raça. E eu sei, eu não vim para a América no Mayflower ou por minha própria vontade. Nosso povo foi trazido para cá involuntariamente, contra seu desejo. Então, se nós apresentamos problemas agora, eles não deveriam nos acusar por estarmos aqui. Eles trouxeram-nos para cá. [aplauso].

Uma das razões por que eu sinto que é melhor continuar muito informal quando discutir este tipo de tópico, quando as pessoas estão discutindo coisas baseadas em raça, elas têm a tendência de ser muito limitadas e ficar emocionadas e envolver-se toda – especialmente pessoas brancas. Eu descobri que pessoas brancas são normalmente muito inteligentes, até que vocês obtenham delas uma fala sobre o problema racial. Então, elas obtêm uma cegueira como um morcego e querem que vocês vejam o que elas sabem que é exatamente o oposto da verdade. [aplauso].

Eu preferiria que nós tentássemos e fizéssemos é sermos muito informais, onde nós poderemos relaxar e mantermos a mente aberta, e tentarmos e concebermos os modelos ou os hábitos a serem vistos por nós mesmos, ouvidos por nós mesmos, pensados por nós mesmos, e então nós poderemos nos aproximar de uma decisão inteligente sobre nós mesmos.

Sem rodeios, minha posição, como eu disse hoje na Colgate, eu sou um Muçulmano, o que apenas significa que a minha religião é o Islamismo. Eu acredito em Deus, o ser Supremo, o criador do universo. Que é uma forma muito simples de religião, fácil de entender. Eu acredito em Deus. Se havia um tudo deles, deveria ser uma religião confusa. Mas eu acredito em um Deus, e eu acredito que este Deus tivesse uma religião, tenha uma religião, sempre teremos uma religião. E o que este Deus ensinou a todos os profetas sobre a mesma religião, então não há argumentos sobre quem foi o maior ou quem foi o melhor: Moisés, Jesus, Muhammad, ou algum dos outros. Todos eles eram profetas, eles vieram de um Deus, eles tiveram uma doutrina, e esta doutrina foi designada para dar purificação à humanidade, então isto tudo a humanidade veria que foi religião e teria um tipo de irmandade que seria praticada aqui nesta terra. Eu acredito nisto.

E depois de aceitar a religiosidade de Deus, eu acredito na irmandade do homem. Mas apesar do fato que eu acredito na irmandade do homem, eu tenho que ser um realista e ter consciência de que aqui na América nós somos uma sociedade que não pratica a irmandade. Não é praticada como é pregada. Pregamos irmandade, mas não praticamos irmandade. E por causa disso a sociedade não pratica irmandade, aqueles de nós que são Muçulmanos – aqueles de nós que deixaram o movimento Muçulmano Negro e reagruparam-se como Muçulmanos, em um movimento baseado sobre o Islamismo ortodoxo – nós acreditamos na irmandade do Islamismo.

Mas nós também compreendemos que o problema apresentado às pessoas Negras neste país é complexo e tão complicado e tem sido tão longo aqui, não resolvido, que é absolutamente necessário a nós formarmos outra organização. A qual nós formamos, que é a organização não-religiosa e que é conhecida como a Organização da Unidade Afro-americana, que é tão estruturada organizacionalmente para permitir participação ativa de qualquer Afro-americano, e Americano Negro, em um programa que é planejado para eliminar a política negativa, econômica e social maliciosas que o nosso povo é confrontado nesta sociedade. E nós temos que iniciar porque nós compreendemos que temos que lutar contra o pecado da sociedade que tem falhado em produzir irmandade para todos os membros desta sociedade. Isto de modo algum significa que somos antibranco, antiazul, antiverde ou antiamarelo. Nós somos antierrado. Nós somos antidiscrminação. Nós somos anti-segregação. Nós somos contra qualquer um que queira praticar alguma forma de segregação ou discriminação contra nós porque nós não costumamos ser uma cor que é aceitável por vocês. Nós acreditamos em lutar. [aplauso].

Nós não julgamos um homem pela cor de sua pele. Nós não julgamos vocês porque vocês são brancos. Nós não julgamos vocês porque vocês são negros. Nós não julgamos vocês porque são marrons. Nós não julgamos vocês pelo que vocês fazem, pelo que praticam. E enquanto vocês praticam maldades, nós estamos contra vocês. E para nós, a pior forma de maldade é a maldade que é baseada em julgar um homem pela cor de sua pele. E eu não acho que qualquer um aqui possa negar que nós estamos vivendo em uma sociedade que apenas não julga um homem de acordo com seu talento, de acordo com seu conhecimento, de acordo com sua bagagem acadêmica, ou falta de bagagem acadêmica. Esta sociedade julga um homem apenas pela cor de sua pele. Se você é branco, você pode ir avante, e se você é negro, você tem que brigar a seu jeito a cada passo do seu caminho, e você ainda não consegue ir avante. [aplauso].

Nós estamos vivendo em uma sociedade que está de acordo e largamente controlada por pessoas que acreditam em segregação. Nós estamos vivendo em uma sociedade que está de acordo e largamente controlada por pessoas que acreditam em racismo, e praticam segregação, discriminação e racismo. Nós acreditamos em um – e eu digo que isto é controlado não pelos brancos bem-intencionados, isto é controlado pelos segregacionistas, pelos racistas. E vocês podem ver pelo modelo que esta sociedade segue por todo o mundo. Justo agora na Ásia vocês têm o Exército Americano jogando bombas sobre pessoas de pele escura. Agora você não pode dizer que – não há jeito que você possa justificar estar longe de casa, jogando bombas sobre alguém. Se você fosse a próxima porta, eu poderia ver isto, mas você não pode ir para longe de seu país e jogar bombas sobre alguém e justificar sua presença lá, não comigo. [aplauso].

Isto é racismo. Racismo praticado pela América. Racismo que envolve uma guerra contra pessoas de pele escura na Ásia, outra forma de racismo envolve uma guerra contra pessoas de pele escura no Congo, a mesma como esta que envolve uma guerra contra pessoas de pele escura no Mississipi, Alabama, Geórgia, e Rochester, Nova York. [aplauso].

Então nós não somos contra as pessoas porque elas são brancas. Ma porque nós somos contra aqueles que praticam racismo. Nós somos contra aqueles que jogam bombas sobre pessoas porque a cor delas por acaso é de tom diferente do deles. E porque nós somos contra isso, a imprensa diz que nós somos violentos. Nós não somos pela violência. Nós somos pela paz. Mas as pessoas que nós somos totalmente contra são tão violentas, vocês não podem ser pacíficos quando vocês estão tratando com eles. [gargalhada e aplauso].

Eles acusam-nos do que eles mesmos são culpados. Isto é o que o criminoso sempre faz. Ele bombardeará você, então acusará você de bombardear a você mesmo. Ele oprimirá seu crânio, e então acusará você de atacá-lo. Isto é o que os racistas têm sempre feito – o criminoso, aquele que desenvolveu um processo criminoso para a ciência. Ele praticará sua ação criminosa, e então usará a imprensa para fazer você de vítima – olhe como vítima é o criminoso e o criminoso é a vítima. Assim eles fazem. [aplauso]. E vocês aqui em Rochester provavelmente sabem mais sobre isso do qualquer pessoa em qualquer outro lugar.

Aqui temos um exemplo de como eles fazem isso. Eles absorvem a imprensa, e através dela, eles alimentam estatísticas, [inaudível] chamam de estatísticas seus crimes, para o público branco. Porque o público branco é dividido. Alguns parecem bons, e alguns não parecem bons. Alguns são bem-intencionados, e alguns não são bem-intencionados. Isto é verdade. Vocês encontram alguns que não são bem-intencionados, e alguns que são bem-intencionados. E normalmente aqueles que não são bem-intencionados excedem em números aqueles que são bem intencionados. Vocês precisam de um microscópio para acharem aqueles que são bem-intencionados. [aplauso].

Então, eles não gostam de fazer nada sem o suporte do público branco. Os racistas, aqueles que são normalmente muito influentes na sociedade, não fazem seus movimentos sem primeiro tentar obter a opinião pública do seu lado. Então eles usam a imprensa para obter a opinião pública do seu lado. Quando eles querem abafar ou oprimir a comunidade negra, o que eles fazem? Eles pegam estas estatísticas, e através da imprensa, eles alimentam o público. Eles fazem isto parecer que a taxa de crime na comunidade negra é muito mais alta do que é em qualquer outro lugar. O que isto faz? [aplauso].

Esta mensagem – esta é uma mensagem muito hábil usada pelos racistas para fazer os brancos que não são racistas pensarem que como a taxa de crime na comunidade negra é tão alta, isso pinta a comunidade negra com a imagem de criminosa. Isso faz parecer que todas as pessoas na comunidade negra são criminosas. E assim que esta impressão é dada, neste caso isto é possível construir, ou pavimentar o caminho para começar uma situação típica de polícia na comunidade negra, obtendo a aprovação total do público branco quando a polícia vem e usa todo o tipo de métodos brutais para oprimir o povo negro, esmagando seus crânios, cachorros sobre eles, e coisas deste tipo. E os brancos cooperam com isso. Porque eles pensam que além de todas as pessoas há um criminoso em algum lugar. Isto é que – a imprensa faz isto. [aplauso].

Isto é perícia. Esta perícia é chamada – isto é uma ciência que é chamada fazer imagem. Eles mantêm vocês sob controle através desta ciência de imagens de retórica. Eles até fazem vocês olharem com menosprezo vocês mesmos, dando a vocês uma má imagem de vocês mesmos. Algumas de nossas próprias pessoas negras têm engolido esta imagem delas mesmas e digerido ela rapidamente, até elas próprias não quererem morar na comunidade negra. Elas não querem que estejam ao redor delas pessoas negras. [aplauso].

Isto é uma ciência que eles usam, muito habilidosamente, para fazer o criminoso parecer a vítima, e fazer a vítima parecer o criminoso. Exemplo: nos Estados Unidos durante o verão eles tiveram os distúrbios. Eu estava na África, felizmente. [gargalhada]. Durante estes distúrbios, ou por causa destes distúrbios, ou depois dos distúrbios, mais uma vez a imprensa, muito habilidosamente, descreveu os tumultuadores como assassinos, criminosos, ladrões, porque eles estavam acabando com a propriedade.

Agora pensem vocês, se é verdade que a propriedade foi destruída. Mas olhem por outro ângulo. Nesta comunidade negra, a economia da comunidade não está nas mãos do homem negro. O homem negro não é seu próprio senhor. Os edifícios que ele vive são propriedade de alguém diferente. As lojas na comunidade são administradas por alguém diferente. Tudo na comunidade está fora de suas mãos. Ele não tem nenhum direito de decidir nisto ou que quer que seja, senão morar lá e pagar o mais alto aluguel pelo mais degradante lugar para morar. [aplauso]. Ele paga os mais altos preços pela comida, pela comida de mais baixa classificação. Ele é vítima disso, uma vítima da exploração econômica, exploração policial, e muitos outros tipos.

Agora, ele é tão frustrado, tão reprimido, tanta energia explosiva nele, que ele gostaria de pegar aquele que o está explorando. Mas quem o está explorando não mora na vizinhança. Ele apenas é dono da casa. Ele apenas é dono da loja. Ele apenas é dono da vizinhança. Quando o homem negro explode, aquele que ele quer pegar não está lá. Então ele destrói a propriedade daquele – ele não é ladrão. Ele não está tentando roubar sua mobília barata ou sua comida barata. Ele quer pegar você, mas você não está lá. [gargalhada e aplauso].

E em vez de os socialistas analisarem isso como de fato isso é, tentando entender isso como de fato isso é, novamente eles dissimulam o discurso real, e eles usam a imprensa para fazer isso parecer que estas pessoas são ladrões, assassinos. Não! Elas são as vítimas de roubos organizados, proprietários organizados que não são nada, mas ladrões, comerciantes que não são nada, mas ladrões, policiais que sentam na entrada da cidade e que não são nada, mas ladrões em parceria com os proprietários e os comerciantes. [aplauso].

Mas novamente, a imprensa é usada para fazer a vítima parecer o criminoso e fazer o criminoso parecer a vítima. E vocês, que chamam vocês mesmos de brancos bem-intencionados – ha, ha - vocês engolem isso e apenas ficam tão enjoados quanto os brancos que não têm boas pretensões.

Isso é retórica. E apenas quando essa retórica é praticada no nível local, vocês podem entender isso melhor através de um exemplo internacional. O exemplo mais recente no nível internacional para trazer vivacidade para o que eu estou dizendo é o que aconteceu no Congo[81].

Olhem o que aconteceu. Nós tivemos uma situação onde um avião jogava bombas sobre aldeias africanas. Uma aldeia africana não tem defesa contra bombas. E uma aldeia africana não é ameaça suficiente que ela tenha que ser bombardeada. Mas aviões estavam jogando bombas sobre aldeias africanas. Quando estas bombas batiam, elas não distinguiam entre inimigos e amigos. Elas não distinguiam entre homem e mulher. Quando estas bombas eram jogadas sobre aldeias africanas no Congo, elas eram jogadas sobre mulheres negras, homens negros e crianças negras. Estes seres humanos foram soprados para um lugar indefinido. Eu não ouvi gritaria, nenhuma voz de compaixão por estes milhares de pessoas negras que foram trucidadas pelos aviões. [aplauso].

Por que não houve gritaria? Por que não houve inquietação? Porque, novamente, a imprensa muito habilidosamente fez as vítimas parecerem que elas eram as criminosas, e as criminosas parecerem que elas eram as vítimas. [aplauso].

Eles se referem às aldeias como “rebeldes confinados”, vocês sabem. É como dizer, porque eles são aldeias de confinamento de rebeldes, você pode destruir a população, e está certo. Eles também se referem aos negociantes da morte como “Americanos-treinados”, “pilotos Cubanos anti-Castro.” Isso fez isto certo. Porque estes pilotos, estes mercenários – vocês sabem o que é um mercenário, ele não é um patriota. Um mercenário não é alguém que vai para a guerra sem patriotismo por seu país. Um mercenário é um matador alugado. Uma pessoa que mata, que tira sangue por dinheiro, sangue de qualquer um. Mata um ser humano tão facilmente quanto mata um gato ou um cachorro ou uma galinha.

Então estes mercenários, jogando bombas sobre aldeias Africanas, não cuidando de nada, se há ou não inocentes, mulheres, crianças e bebês indefesos sendo destruídos por suas bombas. Mas porque eles são chamados “mercenários,” dando um nome glorificado, isto não excita vocês. Porque eles são referidos como pilotos “Americanos-treinados”, porque eles são Americanos-treinados, isto faz eles certos. “Cubano anti-Castro”, isto faz eles certos. Castro é um monstro, então qualquer um que é contra Castro está muito bem conosco, e qualquer coisa que eles façam por lá, isto está muito bem conosco. Você vê como eles enganam a sua mente? Eles põem sua mente direto em um saco, e levam ela onde quer que queiram tão bem. [aplauso].

Mas isso é algo pelo que vocês têm que olhar e responder. Por que eles são aviões americanos, bombas americanas, escoltadas por pára-quedistas americanos, armados com metralhadoras. Mas, vocês sabem, eles dizem que eles não são soldados, eles estão lá apenas como acompanhantes, como eles começaram com alguns informantes no Vietnan do Sul. Vinte mil deles – apenas informantes. Há apenas “acompanhantes.” Eles são capazes de fazer tudo deste grande número de assassinatos e escapar impunemente disso, rotulando isso “humanitário”, “um ato de humanistarismo.” Ou “em nome da liberdade,” “em nome da independência.” Todo tipo de slogans altamente sonoros, mas eles são feitos tão habilidosamente, que até vocês e eu, que chamo de sofisticados neste vigésimo século, somos capazes de ver isso, e pormos o selo de aprovado sobre isso. Simplesmente porque isto está sendo feito para pessoas com pele negra, por pessoas com pele branca.

Eles pegam um homem que é um assassino a sangue-frio, chamado Tshombe. Vocês ouviram dele, Tio Tom Tshombe [gargalhada e aplauso] e assassinou o primeiro ministro, o legítimo primeiro ministro, Lumumba. Ele assassinou-o. [aplauso]. Agora é um homem que é um assassino internacional, selecionado pelo Departamento de Estado e colocado sobre o Congo e apoiado em sua posição pela sua taxa do dólar. Ele é um matador. Ele é alugado pelo nosso governo. Ele é um matador de aluguel. E mostrar o tipo de matador de aluguel que ele é, assim que ele está em serviço, ele aluga mais matadores da África do Sul para derrubarem seu próprio povo. E você admira-se porque sua imagem americana no exterior está tão falida.

Note que eu disse, “sua imagem americana no exterior está tão falida.”

Eles fazem este homem aceitável pela astúcia, dizendo na imprensa que ele é o único que pode unir o Congo. Ha. Um assassino. Eles não deixarão a China nas Nações Unidas porque eles dizem que ela declarou guerra às tropas das Nações Unidas na Coréia. Tshombe declarou guerra às tropas das Nações Unidas em Katanga; vocês deram dinheiro a ele e apoiaram-no[82]. Vocês não usam o mesmo critério. Vocês usam o critério aqui e mudam-no aqui. Mas isto são vocês, onde todas as pessoas podem ver vocês hoje. Vocês fazem vocês mesmos parecerem doentes na visão mundial, tentando serem as pessoas bobas que vocês estão pelo menos deste modo com suas fraudes. Mas hoje o saco de truques de vocês absolutamente acabou. O mundo inteiro pode ver o que vocês estão fazendo.

A imprensa apronta rapidamente a histeria no público branco. Então ela muda os instrumentos e começa a trabalhar tentando obter a simpatia do público branco. E assim ela muda os instrumentos e obtém o público branco para apoiar qualquer que seja a ação criminal que eles estão deixando pronta para envolver os Estados Unidos.

Lembram como eles se referiram aos reféns como “reféns brancos”. Não “reféns.” Eles disseram isto “canibais” no Congo tinham “reféns brancos.” Oh, e isto deixou vocês todos perturbados. “Freiras brancas,” “sacerdotes brancos,” “missionários brancos”. Qual é a diferença entre um refém branco e um refém negro? Qual a diferença entre uma vida branca e uma vida negra? Vocês devem pensar que há uma diferença, porque a imprensa deles particulariza a brancura. “Dezenove reféns brancos” causam em vocês abalos em seus corações. [gargalhada e aplauso].

Durante os meses quando bombas estavam sendo jogadas sobre pessoas negras por centenas e milhares, vocês não disseram nada. E vocês não fizeram nada. Mas tão logo quanto um punhado de pessoas brancas que não tinham nenhum envolvimento na obtenção de negócios como estas coisas em primeiro lugar [gargalhada e aplauso] - tão logo quanto suas vidas tornaram-se envolvidas, vocês interessaram-se.

Eu estava na África durante o verão quando os mercenários e os pilotos estavam fazendo pessoas negras caírem no chão como se voassem. Mesmo assim, na imprensa do Oeste isto não ganharia menção. Isto não foi mencionado. Se isto fosse mencionado, seria mencionado na seção de classificados do jornal. Em algum lugar onde vocês precisariam de um microscópio para descobri-lo.

E nesta época os irmãos Africanos, os primeiros eles não estavam tomando como reféns. Eles apenas começaram a tomar como reféns quando eles descobriram que estes pilotos estavam bombardeando suas aldeias. E então eles tomaram como reféns, carregando-os para dentro da aldeia, e advertiram os pilotos que se vocês jogam bombas sobre as aldeias, vocês atingirão seu próprio povo. Isto era uma guerra de táticas militares. Eles estavam em guerra. Eles apenas mantinham um refém na aldeia para reter os mercenários de assassinatos em massa de pessoas desta aldeia. Eles estavam retendo-os como reféns porque eles eram canibais. Ou porque eles pensavam que suas carnes eram saborosas. Alguns destes missionários estavam lá por quarenta anos e não tinham comido nada. [gargalhada e aplauso]. Se eles fossem comê-los, eles os teriam comido quando eles eram jovens e tenros. [gargalhada e aplauso]. Porque vocês não podem ainda digerir esta carne branca velha sobre um frango velho. [gargalhada].

Então isto é fantástico. Eles usam sua habilidade para criar imagens, e então eles usam estas imagens que eles criaram pra conduzirem as pessoas. Para confundir as pessoas e fazê-las aceitar o errado como certo e rejeitar o certo pelo errado. Fazer as pessoas atualmente pensarem que o criminoso é a vítima e a vítima é o criminoso.

Assim como mostrei isto, vocês podem dizer, “o que tudo isto tem a ver com o homem negro na América? E o que isto tem a ver com as relações entre negros e brancos aqui em Rochester?” Vocês têm que entender isto.

Então, até 1959 a imagem do continente Africano foi criada pelos inimigos da África. África era uma terra dominada pelos poderosos de fora. Uma terra dominada pelos Europeus. E como estes Europeus dominaram o continente da África, foram eles que criaram a imagem da África que foi projetada no estrangeiro. E eles projetaram a África e as pessoas da África em uma imagem negativa, uma imagem detestável. Eles fizeram-nos pensar que a África era uma terra de floresta tropical, uma terra de animais, uma terra de canibais e selvagens. Isso era uma imagem detestável.

E porque eles foram tão bem sucedidos na projeção dessa imagem negativa da África, aqueles de nós aqui na ancestralidade Africana do Oeste, a Afro-americana, nós consideramos a África como um lugar detestável. Nós consideramos África como pessoa detestável. E se você se referisse a nós como um Africano, isso era como [inaudível], ou falando sobre nós de um modo que nós não queremos ser chamados.

Por quê? Porque aqueles que oprimem sabem que você não pode fazer uma pessoa odiar a raiz sem fazê-la odiar a árvore. Você não pode odiar a sua origem e não acabar odiando você mesmo. E desde que nós todos temos origem na África, você não pode fazer-nos odiar a África sem fazer-nos odiar a nós mesmos. E eles fizeram isso muito habilidosamente.

E qual foi o resultado? Nós acabamos com vinte e dois milhões de pessoas negras aqui na América que odiamos qualquer coisa sobre nós que seja africano. Nós odiamos as características africanas, as características africanas. Nós odiamos nosso cabelo. Nós odiamos nosso nariz, a forma de nosso nariz, e a forma de nossos lábios, a cor de nossa pele. Sim, nós odiamos. E isso foi você que ensinou-nos a odiar nós mesmos simplesmente pela sagacidade de movimentos táticos para levar-nos a odiar a terra de nossos avós e as pessoas daquele continente.

Já que nós detestamos aquelas pessoas, detestamos nós mesmos. Já que odiamos o que nós pensamos que eles parecem, nós odiamos o que nós atualmente parecemos. E você me chama professor odioso? Porque, você ensinou-nos a odiar nós mesmos. Você ensinou o mundo a odiar uma raça inteira de pessoas e tem a coragem agora de reclamar de nós por detestarmos você simplesmente porque nós não gostamos da corda que você pôs ao redor do nosso pescoço. [aplauso].

Quando você ensina um homem a odiar seus lábios, os lábios que Deus deu a ele, a forma do nariz que Deus deu a ele, a textura do cabelo que Deus deu a ele, a cor da pele que Deus deu a ele, você comete o pior dos crimes que uma raça de pessoas pode cometer. E esse é o crime que você cometeu.

Nossa cor tornou-se uma prisão, uma prisão psicológica. Nosso sangue – sangue americano – tornou-se uma prisão psicológica, uma prisão porque nós fomos humilhados nisso. E mesmo aqueles que dirão isso em seu rosto, e dirão que não foram eles; foram eles! Nós nos sentimos capturados porque nossa pele era negra. Nós nos sentimos capturados porque nós temos sangue africano em nossas veias.

Isso é como você nos aprisionou. Não apenas trazendo-nos para cá e fazendo-nos escravos. Mas a imagem que você criou de nossa terra-mãe e a imagem que você criou de nossas pessoas daquele continente foi uma armadilha, era uma prisão, era uma algema, era a pior forma de escravidão que alguma vez foi inventada por uma raça chamada civilizada e uma nação civilizada desde o começo do mundo.

E você ainda vê o resultado disso entre nosso povo. Nesse país hoje. Porque nós odiamos o nosso sangue africano, nos sentimos inadequados, nos sentimos inferiores, e nos sentimos abandonados. E em nosso estado de abandono, nós não caminharíamos por nós mesmos, nos inclinamos a vocês por ajuda, e então você não nos ajudaria. Nós não nos sentimos adequados. Inclinamo-nos para você por conselho e você dá-nos um conselho errado. Inclinados a você por direção e você mantém-nos em círculos.

Mas a mudança aconteceu. Em nós. E de quê? Voltando a 1955 na Indonésia – Bandung – eles tiveram uma conferência de pessoas de peles escuras. As pessoas da África e da Ásia ficaram juntas pela primeira vez em séculos. Elas não tinham armas nucleares, elas não tinham esquadrilha de aviões, nem de navios. Mas elas discutiram a situação angustiante delas e descobriram que havia uma coisa que todos nós tínhamos em comum – opressão, exploração, sofrimento. E nós tínhamos um opressor comum, um explorador comum.

Se um irmão veio do Quênia e chamou seu opressor um homem inglês; outro veio do Congo, ele chamou seu opressor um belga; outro veio da Guiné, ele chamou seu opressor de francês. Mas quando você trouxe os opressores juntos, havia uma coisa que todos eles tinham em comum, eles eram todos da Europa. E estes europeus eram opressores dos povos da África e da Ásia.

E já que nós podíamos ver que havia opressão em comum e exploração em comum, tristeza e desolamento e desgosto em comum, nosso povo começou a reunir-se e estabeleceu a Conferência de Bandung, que era hora de esquecermos nossas diferenças. Nós tínhamos diferenças. Alguns eram Budistas, alguns eram Hindus, alguns eram Cristãos, alguns eram Muçulmanos, alguns não tinham nenhuma religião. Alguns eram socialistas, alguns eram capitalistas, alguns eram comunistas, e alguns não tinham nenhuma organização. [gargalhada]. Mas com todas essas diferenças que existiam, eles concordaram em uma coisa, o espírito de Bundung foi, de lá pra frente, desenfatizar as áreas de diferença e enfatizar as áreas que tinham em comum.

E este era o espírito de Bandung que alimentou as chamas de nacionalismo e liberdade não apenas na Ásia, mas especialmente no continente africano. De 1955 a 1960 as chamas de nacionalismo, independência no continente africano, tornaram-se tão claras e tão furiosas, que elas eram capazes de queimar e causar sofrimento agudo a qualquer coisa que entrasse em seu caminho. E esse mesmo espírito não parou no continente africano. E de um modo ou de outro, escorregou para dentro do Hemisfério Oeste e entrou no coração e na mente e na alma do homem negro no Hemisfério Oeste que supostamente tinha sido separado do continente africano por quase quatrocentos anos.

Mas o mesmo desejo por liberdade que moveu o homem negro no continente africano começou a queimar no coração e na mente e na alma do homem negro aqui, na América do Sul, América Central e América do Norte, mostrando-nos que nós não estávamos separados. Apesar de que havia um oceano entre nós, nós ainda éramos movidos pela mesma pulsação do coração.

O espírito de nacionalismo no continente africano começou a destruir os poderes, os poderes coloniais. Eles não podiam estar lá. A Inglaterra entrou em problemas no Quênia, Nigéria, Tanzânia, Zanzibar, e outras áreas do continente. A França entrou em problemas na França Equatorial inteira no Oeste da África, incluindo Algeria, tornou-se um problema reconhecido para a França. O Congo não permitiria por mais tempo nenhum o belga ficar lá. O continente africano inteiro tornou-se explosivo de 1954-1955 até 1959. Por 1959 eles não podiam ficar lá por mais tempo.

Isso não era o que eles queriam fazer. Isso não era que todos de repente tornaram-se benevolentes. Isso não era que todos de repente tinham cessado de esperar a exploração do homem negro pelos seus recursos naturais. Mas era o espírito de independência que estava queimando no coração e na mente do homem negro. Ele não por muito tempo permitiria que ele mesmo fosse colonizado, oprimido e explorado. Ele foi prestativo ao pôr sua vida abaixo e tomar as vidas daqueles que tentaram tomar a sua, que era um espírito novo.

O poder colonial não saiu. Mas o que eles fizeram? Sempre que uma pessoa está jogando basquete, se você olha para ele, se os jogadores do time oposto cercam-no e ele não quer livrar-se de ou jogar a bola fora, ele tem que passá-la para alguém que está livre, que é do mesmo time como ele. E desde que Bélgica e França e Inglaterra e esses outros poderes coloniais foram cercados – eles foram exibidos como poderes coloniais – eles tinham que descobrir alguém que estivesse ainda em lugar limpo, e o único em extensão de área limpa tanto quanto os africanos estavam preocupados eram os Estados Unidos. Então eles passaram a bola para os Estados Unidos. E esta administração pegou-a e correu como um maluco alguma vez já fez. [gargalhada e aplauso].

Já que eles pegaram a bola, eles estavam cientes de que seriam confrontados com um problema novo. O problema era que os africanos tinham acordado. E no seu acordar eles não estavam amedrontados. E porque os africanos não estavam com medo, era impossível para os poderosos Europeus ficar naquele continente pela força. Então nosso Departamento de Estado, pega a bola e na sua nova análise, eles compreendem que eles tinham que usar uma nova estratégia se eles iriam substituir os poderosos coloniais da Europa.

Qual era a sua estratégia? A aproximação “amigável”. Em vez de mover-se lá com os dentes cerrados, eles iniciariam sorrindo para os africanos. “Nós somos seus amigos”. Mas em ordem para convencer o Africano de que ele era seu amigo ele teve que iniciar fingindo como se eles fossem nossos amigos.

Você não ontem o sorriso do homem para você porque você estava brabo, não. Ele estava tentando impressionar o seu irmão do outro lado do mar. Ele sorriu para você para fazer o seu sorriso consistente. Ele iniciou usando uma aproximação amigável lá. Uma aproximação de boa vontade. Uma aproximação filantrópica. Chamo isso de colonialismo beneficente. Imperialismo filantrópico. Humanitarismo apoiado pelo dolarismo. Simbolismo. Essa é a aproximação que eles usaram. Eles não foram para lá com boas intenções. Como você sairia daqui e iria para o continente Africano com Corpos de Paz e Encruzilhadas e esses outros equipamentos quando você está enforcando as pessoas negras no Mississipi? Como poderia você fazer isso? [aplauso].

Como você poderia treinar missionários, supostamente lá para ensinar a eles sobre Cristo, e não deixaria um homem negro na sua igreja de Cristo como aqui em Rochester, muito menos no Sul. [aplauso]. Você sabe, essas são algumas coisas para pensar sobre. Fazem-me ficar furioso quando eu penso nisso. [gargalhada].

De 1954 a 1964 pode facilmente ser considerado como a era dos estados emergentes da África. E como os estados Africanos emergiram de 1954 a 1964, qual o impacto, qual o efeito que teve sobre os Afro-americanos, o americano Negro? Como o homem negro na África obteve independência, isso o pôs em uma posição de ser dono de fazer sua própria imagem. Até 1959 quando você e eu pensávamos em um africano, nós pensávamos em alguém despido, vindo com os “tom-toms”, com ossos em seu nariz. Oh, sim! [gargalhada].

Essa era a única imagem que você tinha na sua mente de um africano. E de 1959 em diante, quando eles começam a vir para dentro da UN e você vê eles na televisão, você fica chocado. Aqui estava um africano que podia alar inglês melhor do que você. Ele fazia mais senso do que você. Ele tinha mais liberdade do que você. [aplauso]. Porque nos lugares onde você não podia ir, tudo que ele tinha que fazer era vestir suas roupas e caminhar para frente além de você. [gargalhada e aplauso].

Isso tinha que mexer com você. E foi apenas quando você se tornou chocado que você começou a acordar realmente. [gargalhada].

Então como as nações Africanas obtiveram sua independência e a imagem do continente Africano começou a mudar pelo mesmo grau que a imagem da África trocou de negativa para positiva, subconscientemente, o homem negro pelo Hemisfério Oeste inteiro, no subconsciente de sua mente, começou a se identificar com essa imagem Africana positiva que emergia.

E quando ele viu o homem negro no continente Africano adquirindo resistência, isso fez ele encher-se de desejo também de adquirir resistência. A mesma imagem, a mesma – justo como a imagem Africana era negativa, e você obtém esse chapéu velho na mão, compromisso, olhar horrível – nós estávamos do mesmo jeito. Mas quando nós começamos a ler sobre Jomo Kenyatta e os Mau Mau e outros, então você descobre pessoas negras nesse país começar a pensar ao longo da mesma linha. E mais rigorosamente ao longo da mesma linha de que alguns deles realmente querem admitir.

Quando eles viram – exatamente como eles tinham que mudar sua aproximação com as pessoas no continente Africano, eles também então começaram a mudar sua aproximação com nossas pessoas neste continente. Como eles usavam simbolismos e todas outras aproximações amigáveis, beneficente, filantrópicas no continente Africano, que eram apenas sinal de empenho, eles começaram a fazer a mesma coisa conosco aqui nos Estados Unidos.

Simbolismo. Eles surgiram com todos os tipos de programas que não eram realmente designados para resolver os problemas de qualquer pessoa. Cada movimento que eles fizeram foi um movimento de símbolo. Eles nunca fizeram um movimento real de descida na terra por uma vez para realmente resolver problemas. Eles surgiram com uma decisão de dessegregação da Suprema Corte que eles não tinham posto em prática ainda. Nem mesmo em Rochester, muito menos no Mississipi. [aplauso].

Eles trapacearam as pessoas no Mississipi tentando fazer parecer que eles estavam indo integrar a Universidade do Mississipi. Eles trouxeram um Negro para a Universidade auxiliados por cerca de 6.000-15.000 soldados, eu acho que foi isso. E eu acho que isso custou seis milhões de dólares. [gargalhadas]. E três ou quatro pessoas morreram na ação. E isso foi apenas uma ação. Agora, pense você, e depois um deles vem, eles dizem que há integração no Mississipi. [gargalhada].

Eles fincaram dois deles na escola na Geórgia e disseram que havia integração na Geórgia[83]. Porque, você deveria ser humilhado. Realmente, se eu fosse branco, eu seria tão humilhado que eu rastejaria sob um tapete felpudo. [gargalhada e aplauso].

E eu me sentiria tão baixo enquanto eu estivesse sob o tapete que eu não sairia de corcunda. [gargalhada].

Esse simbolismo, esse simbolismo era um programa que foi designado auxiliar apenas um punhado de negros selecionados. E esses negros selecionados eram dados com destaques positivos, e então eles eram usados para abrir suas bocas e dizer ao mundo, “vejam quanto progresso está sendo feito.” [gargalhada]. Ele deveria dizer, vejam quanto progresso ele está fazendo. [gargalhada]. Por enquanto esses negros selecionados estão comendo o porco, esfregando o cotovelo com pessoas brancas [gargalhada], sentado em Washington D.C., as massas de pessoas negras no país continuam a viver em bairros pobres e em guetos. [aplauso]. Essas massas de pessoas negras nesse país permanecem desempregadas, e as massas de pessoas negras neste país continuam a ir para as piores escolas e a obter a pior educação.

Junto durante o mesmo tempo apareceu um movimento conhecido como movimento Negro Muçulmano. O movimento Negro Muçulmano fez isto: até o tempo em que o movimento Negro Muçulmano veio para a cena, o NAACP era considerado como radical. [aplauso]. Eles queriam investigar isso. Eles queriam investigar isso. CORE [Congresso da Igualdade Racial] e todo o resto deles estava sob suspeita, sob suspeição. De King não era ouvido. Quando o movimento Negro Muçulmano progrediu falando que King de falar que eles falaram, [gargalhada] o homem branco disse, “obrigado, Deus, pela NAACP!” [gargalhada e aplauso].

O movimento Negro Muçulmano fez a NAACP aceitável para as pessoas brancas. Isso fez seus líderes aceitáveis. Eles então começaram a referir a eles como líderes negros responsáveis. [gargalhada]. Que significou que eles eram responsáveis pelas pessoas brancas. [gargalhada e aplauso]. Agora eu não estou aceitando a NAACP. Eu estou apenas dizendo a vocês sobre isso. [gargalhada]. E o que faz isso tão mau: você não pode negar isso. [Malcolm gargalha; gargalhadas na platéia].

Então essa é a contribuição que aquele movimento fez. Isso assustou muitas pessoas. Muitas pessoas que não agiriam certo fora do amor começam a agir certas fora do medo. Porque Roy [Wilkins] e [James] Farmer e alguns dos outros costumavam dizer para as pessoas brancas, “olhem se vocês não agirem certo por nós, vocês vão ter de ouvir deles.” Eles acostumaram-nos a melhorar a própria posição deles, regatear sua própria posição.

Então nenhum problema que você pense da filosofia do movimento Negro Muçulmano, quando você analisar a participação que ele desempenhou na luta das pessoas negras durante os últimos doze anos, você tem que pô-lo no seu próprio contexto e vê-lo na sua própria perspectiva.

O movimento ele mesmo atraiu a maioria dos militantes, a maioria insatisfeita, a maioria descompromissada com elementos da comunidade negra. E também os elementos mais jovens da comunidade negra.

E como esse movimento cresceu e atraiu tanto um militante, descompromissado, elemento insatisfeito, o movimento ele mesmo era supostamente baseado na religião Islamita e por essa razão supostamente um movimento religioso. Mas porque o mundo do Islamismo ou o mundo ortodoxo muçulmano nunca aceitaria o movimento Negro Muçulmano como uma genuína parte dele, eles põem isso de nós que seríamos nisso uma espécie de vácuo religioso. Isso põem-nos em uma posição de identificar nós mesmos pela religião, enquanto o mundo no qual essa religião foi praticada rejeitou-nos como não sendo praticantes legítimos, praticantes dessa religião.

Também o governante tentou manipular-nos e rotular-nos como político do que religioso, então eles poderiam nos cobrar por agitação da ordem pública e subversão. Essa é a única razão. Mas embora nós sejamos rotulados políticos, porque nós nunca fomos permitidos tomar parte na política, nós estamos num vácuo politicamente. Nós fomos num vácuo religioso. Nós fomos num vácuo político. Nós fomos atualmente alienados, tirados de todo tipo de atividade com o mundo que nós estávamos lutando contra.

Nós nos tornamos uma espécie de uma híbrida religião-política, tudo de nós mesmos. Não envolvidos em nada, mas apenas resistindo em trabalhos suplementares condenando tudo. Mas sem posição para corrigir nada porque nós não podíamos tomar ação.

Ainda no mesmo ritmo, a essência do movimento era tal que atraía os ativistas. Aqueles que queriam agir. Aqueles que queriam fazer alguma coisa a cerca dos maus que confrontavam todas as pessoas negras. Nós não estávamos particularmente preocupados com a religião do homem negro. Porque se ele era um Metodista ou um Batista ou um ateísta ou um agnóstico, ele se encontrava no mesmo inferno.

Então nós podíamos ver que nós tínhamos que ter alguma ação, e aqueles de nós que éramos ativistas tornaram-se insatisfeitos, desiludidos. E finalmente a discórdia estabeleceu-se e eventualmente o racha. Aqueles que saíram eram os verdadeiros ativistas do movimento, que eram inteligentes bastantes para quererem algum tipo de programa que nos habilitaria lutar pelos direitos das pessoas negras aqui no Hemisfério Oeste.

Mas ao mesmo tempo, nós queríamos nossa religião. Então quando nós saímos, a primeira coisa que nós fizemos, reagrupamo-nos dentro de uma nova organização conhecida como Mesquita Muçulmana, quartel-general em Nova York. E nesta organização nós adotamos a verdadeira, religião ortodoxa do Islamismo, a qual é a religião da irmandade.

Então enquanto aceitava essa religião e estabeleciam uma organização em que poderia praticar a religião – e imediatamente essa Mesquita Muçulmana particular foi reconhecida e aprovada pela religião oficial do mundo muçulmano – nós compreendemos ao mesmo tempo que nós tínhamos um problema nessa sociedade que ia além de religião. E foi por essa razão que nós estabelecemos a Organização da Unidade Afro-americana, na qual qualquer um na comunidade poderia participar em um programa de ação designado para conduzir sobre o completo reconhecimento e respeito das pessoas negras como seres humanos.

E o lema da Organização da Unidade Afro-americana é “por quaisquer meios necessários.” Nós não acreditamos em combater em uma batalha na qual as regras básicas vão ser declaradas por aqueles que nos suprimiram. Nós não acreditamos que nós podemos executar uma luta tentando vencer a afeição daqueles que por longo tempo nos oprimiram e exploraram.

Nós acreditamos que nossa luta é justa. Nós acreditamos que nossos ressentimentos são justos. Nós acreditamos que o mal praticado contra as pessoas negras nesta sociedade é criminoso e que aqueles que contratam serviços tais como práticas criminosas são para ser considerados por eles mesmos como coisa nenhuma, mas criminosos. E nós acreditamos que nós estamos com nossos direitos para lutar com estes criminosos por todos os meios necessários.

Isso não significa que nós somos pela violência. Mas nós temos visto que o governo federal tem mostrado sua incapacidade, sua absoluta indisposição, para proteger as vidas e a propriedade das pessoas negras. Nós temos visto onde racistas brancos organizados, homem da Klan, homem do Conselho de Cidadãos, e outros podem vir para dentro da comunidade Negra e pegar um homem negro e fazê-lo desaparecer e nada será feito sobre isso. Nós temos visto que eles podem entrar. [aplauso].

Nós reanalisamos nossa condição. Quando nós voltamos a 1939, pessoas Negras na América estavam usando sapatos. Alguns dos mais educados estavam usando – no Michigan, de onde eu vim, em Lansing, a capital, o melhor trabalho que você podia obter na cidade era carregando bandejas para fora no country club para as refeições das pessoas brancas. E normalmente o garçom no country club era considerado como o grande carregador da cidade porque ele tinha um bom trabalho ao redor de pessoas brancas “boas”, você entende. [gargalhada]. Sim.

Ele teve a melhor educação, mas ele teria que estar com sapatos brilhando na State House, o Capitólio. Lustrar os sapatos do governador e os sapatos do procurador-geral, e isso fazia dele um conhecedor, você sabe, porque podia lustrar os sapatos das pessoas brancas que estavam em lugares grandes. Quando qualquer pessoa da cidade queria saber o que era feito na comunidade Negra, ele era seu contato. Ele era quem sabia como o “negro da cidade,” o líder Negro. E aqueles que não estavam lustrando sapatos, os pregadores, também tinham uma grande voz na comunidade. Isso é tudo que eles nos deixavam fazer lustrar sapatos, esperar na mesa, e pregar. [gargalhada e aplauso].

Em 1939, antes de Hitler ter se baseado em violência, ou mais precisamente no tempo – sim, antes de Hitler ter se baseado na violência, um homem negro não podia mesmo trabalhar em uma fábrica. Nós éramos a vala do campo aurífero na WPA[84]. Alguns de vocês esqueceram bem rápido. Nós éramos a vala do campo aurífero no WPA. Nossa comida veio da prosperidade que estava gravada “não ser vendida.” Eu obtive muitas coisas do depósito chamado “não ser vendido,” eu pensava que era um depósito em algum lugar. [gargalhada e aplauso].

Essa é a condição que o homem negro está, e essa era até 1939. Em 1940, quando a guerra – em 1941, quando a guerra – Não, Hitler baseou-se na violência, eu acho, em 1939. Até a guerra ter começado, nós estávamos confinados nessas tarefas domésticas. Quando a guerra começou, eles mesmos não nos levariam para o exército. Um homem negro não era destacamento militar. Ele era ou ele não era? [da platéia: “Não!”] Não! Você não poderia juntar-se à marinha de guerra. E eles não destacariam um negro. Isso foi recentemente em 1939 nos Estados Unidos da América! Eles ensinaram você cantar “encantada terra da liberdade” e o resto disso recheio.

Não! Você poderia juntar-se à marinha de guerra. Você não poderia juntar-se à marinha de guerra. Eles mesmos não destacariam você. Eles apenas levam pessoas brancas. Eles não iniciaram destacando-nos até o líder Negro abrir sua boca grande, [gargalhada] dizendo em torno de “se pessoas brancas devem morrer, nós devemos morrer também[85].” [gargalhada e aplauso]. O líder Negro obteve todos os negros mortos na segunda guerra mundial que nunca tinham que morrer.

Então, quando a América entrou na guerra, imediatamente ela foi enfrentada com a escassez de seres humanos. Até a época da guerra, você não poderia entrar na fábrica. Eu vivi em Lansing, onde era a fábrica da Oldsmobile e da Reo. Havia cerca de três em toda a fábrica e cada um deles tinha uma vassoura. [gargalhada]. Eles tinham educação. Eles tinham ido à escola. Eu acho que um tinha o segundo grau. Mas ele era um “varredor.” [gargalhada].

Quando o tempo endureceu e havia escassez de seres humanos, então eles permitiram-nos nas fábricas. Não completamente sem nenhum esforço de nós mesmos. Não completamente sem nenhum despertar moral repentino de nossa parte. Eles precisam de nós. Eles precisam de seres humanos, qualquer tipo de ser humano. E quando eles ficaram desesperados e em necessidade, eles abriram as portas das fábricas e nós entramos.

Então nós começamos a aprender como operar as máquinas. Então nós começamos a aprender como operar as máquinas, quando eles precisaram de nós. Inseriram nossas mulheres bem como nossos homens. Assim nós aprendemos a operar as máquinas, nós começamos a fazer mais dinheiro. Assim nós começamos a fazer mais dinheiro, nós estávamos aptos a viver em uma pequena vizinhança melhor. Quando nos mudamos para uma pequena vizinhança melhor, nós fomos para uma pequena escola melhor. E quando nós fomos para uma escola melhor, nós obtivemos um pouco de educação melhor e obtivemos uma pequena posição melhor e obtemos um pequeno trabalho melhor.

Isso não era mudança de coração em nossa parte. Isso não era o acordar repentino de nossa consciência moral. Isso era Hitler. Isso era tojo[86]. Isso era Stalin. Sim, isso era pressão de fora, a nível mundial, que habilitou você e eu a dar poucos passos à frente.

Por que eles não nos destacariam e não nos inseririam no exército em primeiro lugar? Eles tinham nos tratado tão mal, eles estavam com medo que se eles nos inserissem no exército e nos entregassem uma arma e nos mostrassem como atirar com ela – [gargalhada] eles temiam que eles não teriam que dizer em que atirar. [gargalhada e aplauso]. E provavelmente eles não teriam tido. Era a consciência deles.

Então eu aponto isso para mostrar que não era mudança de coração por parte do Tio Sam que permitiu alguns de nós irmos poucos passos para frente. Isso foi pressão mundial. Isso foi ameaça de fora, perigo de fora que fez isso – que ocupou a mente dele e o forçou a permitir você e eu ficar de pé um pouco mais alto. Não porque ele nos queria em pé. Não porque ele nos queria para frente. Ele foi forçado.

E uma vez que você analisar adequadamente os ingredientes que abriram as portas mesmo na etapa que elas estavam abertas quebradas, quando você vê o que era, você entenderá melhor sua posição hoje. E você entenderá melhor a estratégia que você necessita hoje. Qualquer tipo de movimento por liberdade das pessoas negras baseado apenas com a limitação da América está absolutamente condenado a falir. [aplauso].

Já que seu problema é combatido dentro do contexto americano, tudo que você pode obter como aliados são cidadãos americanos. Já que você chamou isso de direitos civis, isso é um problema doméstico dentro da jurisdição do governo dos Estados Unidos. E o governo dos Estados Unidos compõe-se de segregacionistas, racistas. Porque, os homens mais poderosos no governo são racistas. Este governo é controlado por trinta e seis comitês, doze comitês parlamentares e dezesseis comitês setoriais. Treze dos vinte membros do Congresso que acumulavam os comitês parlamentares são do Sul. Dez dos dezesseis Senadores que controlam os comitês do Senado são do Sul. O que significa que dos trinta e seis comitês que controlam as informações externas e domésticas, e a índole do país no qual nós vivemos, dos trinta e seis, vinte e três deles estão nas mãos de racistas. Francamente, pedra-fria, segregacionistas mortos. Isso é o que você e eu temos que lutar contra. Nós estamos em uma sociedade onde o poder está nas mãos daqueles que são a pior espécie da humanidade.

Agora como nós vamos tirar vantagem? Como nós vamos obter justiça no Congresso que eles controlam? Ou no Senado que eles controlam? Ou na Casa Branca que eles controlam? Ou da Suprema Corte que eles controlam?

Você diz, “Bem, olhe para a decisão bonita que a Suprema Corte legou.” Irmão, olhe para isso! Você não sabe que esses homens da Suprema Corte são mestres da legalidade – não apenas de lei, mas de fraseologia lícita. Eles são tão mestres da linguagem lícita que eles poderiam muito facilmente ter legado uma decisão de dessegregação na educação então redigida que ninguém poderia ser enganado. Mas eles surgiram com essas coisas redigidas de tal modo que aqui dez anos passaram, e há todo tipo de brechas nela. Eles sabem o que eles estão fazendo. Eles fingem dar a você alguma coisa enquanto sabem todo o tempo que você não pode utilizar isso.

Eles vieram no último ano com um projeto de lei dos direitos civis que eles divulgaram em todo redor do mundo como se isso os levasse para a terra prometida da integração. Oh sim! Recém na última semana, o Reverendo direitista Dr. Martin Luther King saiu da prisão e foi para Washington, D.C., dizendo que ele vai pedir cada dia por uma nova legislação para proteger os direitos de voto para as pessoas negras no Alabama. Por quê? Você recém teve legislação. [gargalhada]. Você recém teve um projeto de lei dos direitos civis. Você tem em mente dizer-me que aquele projeto de lei dos direitos civis altamente anunciado não dá mesmo ao governo federal suficiente poder para proteger as pessoas negras no Alabama que não querem fazer coisa alguma senão registro? Por que, isso é outro truque repugnante, o mesmo que você trapaceou-nos ano a ano. Outro truque repugnante. [aplauso].

Então, desde que nós vimos – eu não quero que você pense que eu estou ensinando a odiar. Eu amo todos que me amam. [gargalhada]. Mas eu certamente não amo aqueles que não me amam. [gargalhada].

Desde que nós vimos todos esses subterfúgios, essas fraudes, esses movimentos evasivos – isso não é apenas a nível federal, a nível nacional, a nível local, e todos os níveis. A geração jovem de Negros que surge agora pode ver que enquanto nós esperamos pelo Congresso e o Senado e a Suprema Corte e o presidente para resolver nossos problemas, ter-nos-ão indo em círculos por outros milhares de anos. E não há nenhum dia como esses.

Desde que o projeto de lei dos direitos civis – eu costumo ver diplomatas Africanos na UN (Nações Unidas) bradando contra as injustiças que foram sendo feitas às pessoas Negras em Moçambique, em Angola, no Congo, na África do Sul. E eu me perguntei por que e como eles podiam voltar para seus hotéis e ligar a TV e ver cães mordendo pessoas Negras logo embaixo no quarteirão e policiais esmagando o crânio de pessoas Negras com seus porretes logo embaixo no quarteirão, e colocando água de mangueira nas pessoas Negras com pressão tão alta que arrancava suas roupas fora, logo embaixo no quarteirão. E eu me perguntei como eles podiam falar tudo que falaram sobre o que estava acontecendo em Angola e Moçambique e todas essas outras situações de violência e ver isso acontecer logo embaixo no quarteirão e se levantar na tribuna das Nações Unidas e não dizer nada sobre isso.

Então eu fui e discuti isso com alguns deles. E eles disseram que enquanto o homem negro na América chama sua luta uma luta de direitos civis, que no contexto dos direitos civis isso é doméstico e fica na jurisdição dos Estados Unidos. E se algum deles abrir sua boca para dizer qualquer coisa sobre isso, é considerada uma violação das leis e regras do protocolo. E a diferença com as outras pessoas era que eles não chamavam seus ressentimentos de ofensas aos direitos civis, eles as chamavamelas de ofensas aos direitos humanos. “Direitos civis” são com a jurisdição do governo onde eles estão envolvidos. Mas “direitos humanos” é parte da Carta das Nações Unidas.

Todas as nações que assinaram a Carta das Nações Unidas cresceram com a Declaração dos Direitos Humanos, e qualquer um que classifique suas queixas sob o rótulo de violações dos direitos humanos, essas queixas podem então ser trazidas para as Nações Unidas e serem discutidas por pessoas de todo o mundo. Por enquanto você chama isso “direitos civis” seus únicos aliados podem ser as pessoas na comunidade próxima, muitas que são responsáveis por suas queixas. Mas quando você chama isso “direitos humanos,” isso se torna internacional. E então você pode levar seus problemas para a Corte Mundial. Você pode levá-los antes ao mundo. E qualquer pessoa em qualquer lugar nessa terra pode tornar-se seu aliado.

Então um dos primeiros passos que nos tornam envolvidos, aqueles de nós que entramos para a Organização da Unidade Afro-americana, foi crescer com um programa que faria nossas queixas internacionais e faria o mundo ver que nosso problema não era um problema negro ou um problema Americano, mas um problema humano. Um problema para a humanidade. E um problema que deveria ser atacado por todos os elementos da humanidade. Um problema que era tão complexo que era impossível para o Tio Sam resolvê-lo por si próprio. E por essa razão nós queremos introduzir um grupo ou consulta a pessoas que estão em tais posições que elas possam ajudar-nos a obter algum tipo de ajustamento para essa situação antes que se torne tão explosiva que ninguém possa segurá-la.

Obrigado. [aplauso]



[79] Democrata e Crônica Rochester, 17 de fevereiro de 1965.

[80] As relações de Malcolm com muitos ativistas da comunidade em Rochester existiam desde o início de 1963. Em resposta ao ataque policial à Mesquita Nacional do Islã, Malcolm foi para Rochester várias vezes para protestar contra a violência policial e organizar suporte para membros NOI acusados falsamente e mais tarde condenados em charges de distúrbios e assaltos. O caso prolongou-se monotonamente até 1966, quando o veredito foi derrubado por recorrer da sentença.

[81] Pano de fundo dos eventos no Congo é dado primeiramente na nota introdutória para discursos de Malcolm no Instituto Tuskegee intitulado “Elijah está disposto a sentar e esperar – eu não estou.”

[82] Washington lutou na guerra de 1950-53 na Coréia sob pretexto de ordem das Nações Unidas. Em 1950, as forças militares dos Estados Unidos chegaram à fronteira da Coréia com a República da China. O governo recentemente assentado em Beijing, informado de que forças poderosas em Washington estavam pressionando para prolongar a ofensiva para reduzir a revolução chinesa, entrou na guerra ao lado do exército de libertação Coreano. Em fevereiro de 1951, Washington obteve uma resolução aprovada na Assembléia Geral das Nações Unidas taxando a China como um “agressor”, a qual foi usada para bloquear sua admissão às Nações Unidas até 1971.

Em 1961 e começo de 1962, tropas na Província Katanga legais a Moise Tshombe chocaram-se com forças militares das Nações Unidas no Congo. Todavia, quando tshombe tornou-se líder do governo central em 1964, ele recebeu suporte político e militar do governo dos Estados Unidos e seus aliados.

[83] Em janeiro de 1961 dois estudantes negros matriculados na Universidade da Geórgia em Athens após a Corte Federal ordenar o fim da segregação. Elas foram suspensas, no entanto, por “seus seguranças pessoais,” quando várias centenas de alunos brancos amotinaram-se. Os estudantes negros retornaram para as aulas após ordem da Corte Federal para sua reintegração.

[84] Durante a Grande depressão de 1930, o governo federal organizou a Administração Progresso Trabalho (WPA), a qual empregou mais de dois milhões de pessoas, primeiramente com baixo-salário, sem habilitação, fazer trabalho de planejar.

[85] Para uma explanação da luta contra a discriminação racial no emprego, nas forças armadas, e através da sociedade americana durante a segunda guerra mundial, ver C.L.R. James e outros, Fighting Racism in World War II (Nova York: Pathfinder, 1980).

[86] Hideki Tojo era primeiro ministro do Japão durante a maior parte da segunda guerra mundial.

quarta-feira, outubro 29, 2008

Para Pastore, crise força ajuste maior nas contas externas

A extensão e a profundidade da crise global exigem do Brasil um ajuste do déficit em conta corrente, o que requer uma desvalorização real do câmbio e uma redução do ritmo de crescimento da demanda doméstica, avalia o ex-presidente do Banco Central (BC) Affonso Celso Pastore. Para ele, o grave problema de solvência que atingiu o sistema financeiro dos Estados Unidos e da Europa provocou uma "parada brusca do fluxo de capitais", afetando "todos os mercados emergentes que, direta ou indiretamente", dependem desses recursos, como o Brasil. Essa parada explica a alta do dólar, diz. Davilym Dourado/valor

Affonso Pastore, ex-presidente do BC: empresas e BC vão descobrir aos poucos onde vai estar o câmbio de equilíbrio

Para ele, o déficit em conta corrente (as transações de bens, serviços e rendas com o exterior), na casa de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) no acumulado no ano, seria "perfeitamente financiável" em condições normais. A questão é que a situação mudou completamente. Segundo ele, os investimentos estrangeiros diretos vão diminuir, o fluxo externo para a bolsa será menor e haverá menos recursos externos para financiar projetos de investimento das empresas. "Essa redução nos fluxos de capitais produz uma depreciação do câmbio real, independentemente de onde ficarem os preços de commodities [os principais produtos exportados pelo país]."

Se as condições externas permitirem um pequeno déficit em conta corrente, ele acredita que um dólar na casa de R$ 1,90 a R$ 2 pode ser suficiente para promover o ajuste, dependendo do nível em que se estabilizarem as commodities. No entanto, se o país tiver que obter um superávit, não descarta a necessidade de um dólar acima de R$ 2,30, talvez em R$ 2,50, embora ressalte a dificuldade de fazer esse tipo de previsão neste momento.

Pastore diz que o Brasil terá de reduzir o ritmo de expansão da absorção doméstica, composta pelo consumo das famílias, o consumo do governo e a formação bruta de capital fixo (FBCF, que mede o investimento na construção civil e em máquinas e equipamentos). Para ele, a melhor resposta seria o corte das despesas do governo. "Se você cortar o gasto público, ajusta a absorção, o que faz cair menos o investimento, subir menos os juros e depreciar menos o câmbio", diz Pastore, enfatizando, porém, não acreditar que o governo seguirá essa trilha. Com isso, o ajuste terá de recair sobre o consumo das famílias e o investimento, acredita ele.

Embora aponte riscos inflacionários da alta do dólar, Pastore considera que o BC deve manter os juros estáveis na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de hoje. Para ele, é importante analisar o impacto da forte contração de crédito sobre a atividade econômica. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: Por que o impacto da crise global sobre o Brasil tem sido muito mais forte do que se imaginava?

Affonso Celso Pastore: Nós estamos na maior crise desde 1929. Isso não é uma figura de retórica. Há pessoas que ainda não perceberam a extensão dessa crise. Ela atinge o Brasil não porque o país esteja fraco. O país tem hoje fundamentos muito melhores. Ela está afetando o Brasil porque é um tsunami de grandes proporções.

Valor: O que essa crise tem de tão mais grave do que as anteriores?

Pastore: Ela não é uma crise de liquidez do sistema bancário internacional, mas de solvência. Quando os bancos estão solventes, mas ilíquidos, isso se resolve com a figura do emprestador de última instância, o banco central, que dá liquidez ao sistema. É o caso do Brasil. Nos EUA e na Europa, como há bancos insolventes, é necessário resolver o problema de solvência, o que pode ser feito de dois modos. O primeiro é deixar o sistema financeiro quebrar. Como a economia de mercado não funciona sem crédito, sem intermediação financeira, você produziria uma depressão de grandes proporções. Para evitar isso, é necessário outro tipo de estratégia. Pode ser a solução idealizada inicialmente pelo secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, em que se compram os ativos e se dá um tempo para os bancos buscarem capital. É algo possível, mas que leva um tempo enorme, além de haver dificuldades técnicas. O sistema bancário quebraria antes disso. A outra solução é a que foi adotada pelo primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown, injetando capital diretamente no sistema [depois seguida pelos EUA]. Com isso, a quebra de bancos deixou de ser um perigo na nossa frente. Mesmo assim, há um outro problema que continua a existir. O crédito tem que encolher, porque a base de capital do sistema se reduziu, em função dos prejuízos gerados pela combinação do estouro da bolha e da alavancagem que havia no sistema.

Valor: Qual o impacto desse processo sobre a economia global?

Pastore: Com menos crédito, haverá recessões se acentuando em países que já estão em recessão. A recessão na Europa vai ser provavelmente mais longa. Nos EUA, ela talvez seja mais curta, mas será bem mais profunda do que a de 2001. Nós vamos ter um processo de redução do PIB dos países industrializados, o que afeta também os mercados emergentes. Países como a China e a Índia podem segurar um pouco a desaceleração global, mas não vão impedi-la Em segundo lugar, vão cair os preços de commodities. Mas o que ocorre agora é uma parada brusca do fluxo de capitais. Talvez seja a maior que nós tenhamos visto, e a mais complicada para lidarmos.

Valor: Por quê?

Pastore: Em 2002, houve uma parada brusca do fluxo de capitais para o Brasil, mas a solução estava nas nossas mãos. O Brasil tinha uma dívida externa muito grande e amortizações que venciam em um ano maiores do que as reservas. A dívida pública era extremamente dolarizada e havia uma mudança de governo. Houve uma parada brusca que depreciou vigorosamente a taxa de câmbio, elevando a relação dívida/PIB. Nós iríamos para uma crise de grandes proporções, se não fosse a sensatez dos dois governos. Antônio Palocci começou a conversar com o ministro Pedro Malan, foi feito o acordo com o Fundo Monetário Internacional, houve a divulgação da Carta ao Povo Brasileiro. Com essas ações e as medidas que se seguiram, como o reforço da meta de superávit primário, nós começamos a sair da crise. Mas ela só dependia de nós. A crise atual é imposta de fora para dentro. Ela não começou num emergente, que recebe uma ajuda do FMI, volta a se equilibrar e o contágio desaparece. Ela atingiu o centro econômico global, os EUA e a Europa, batendo no sistema financeiro, o coração do sistema capitalista. Isso gera uma desalavancagem, o que significa redução de dívidas e do crédito. Lá no final, implica o mundo trabalhar com menos crédito, mas, no curto prazo, causa uma parada brusca de capitais. Atinge todos os emergentes que, direta ou indiretamente, dependem do fluxo de capitais. É assim que o Brasil é atingido.

Valor: Que ajustes o Brasil terá que promover?

Pastore: Vamos olhar a conta corrente. Nós estamos com um déficit que, em condições normais, seria perfeitamente financiável. Ele atinge pouco mais de US$ 20 bilhões em 12 meses. Mas, se você pegar os últimos três ou quatro meses e anualizar, está entre US$ 35 bilhões e US$ 40 bilhões. O déficit está crescendo. O aumento do déficit não seria problemático se você tivesse fluxo de capitais para financiar, mas a situação mudou.

Valor: O fluxo de capitais vai ser muito afetado daqui para frente?

Pastore: Como é que você financia a conta corrente? Não é com capital especulativo. O grosso dos ingressos de capitais no Brasil são investimentos estrangeiros diretos, que totalizaram US$ 36 bilhões nos últimos 12 meses. Uma segunda grande fonte era o investimento em bolsa. Nos IPOs [oferta pública de ações] dos últimos anos, cerca de 70% eram recursos de estrangeiros. Em terceiro lugar, há o financiamento dos investimentos das empresas. Parte é feito com o BNDES, parte com mercado de capitais, mas outra parte é feito com empréstimos externos. Depois há outros capitais de mais curto prazo, como linhas de comércio e ACCs. Há também o dinheiro que entra para comprar títulos brasileiros. Mas essa parte é pequena relativamente ao resto. Se eu digo que os EUA vão para uma recessão maior que a de 2001 e que a Europa vai ter uma recessão longa, os lucros das empresas que podiam fazer investimentos diretos vão cair. Haverá também uma redução importante do ingresso de capitais em bolsa. Para completar, haverá menos crédito e, com isso, menos empréstimos externos para as empresas fazerem investimentos. Essa redução nos fluxos de capitais produz uma depreciação do câmbio real, independentemente de onde ficarem os preços de commodities.

Valor: É possível ter alguma idéia da magnitude da depreciação que será necessária?

Pastore: Se você puder ter um pequeno déficit em conta corrente, menor que o atual, o câmbio real de equilíbrio pode ser de R$ 1,90, R$ 2, dependendo da queda dos preços de commodities. Se você tiver que ir para um equilíbrio na conta corrente, o câmbio pode ser R$ 2, R$ 2,10, R$ 2,15, R$ 2,20, dependendo, de novo, de quanto caírem as commodities. Mas, se houver uma situação hipotética em que essa parada de fluxos de capitais persiste por mais tempo e seja necessário gerar algum superávit em conta corrente, você está falando num câmbio que pode ir para cima de R$ 2,30, R$ 2,40, pode chegar a R$ 2,50. Eu estou sendo propositalmente vago, porque é impossível prever em que nível os fluxos vão se acomodar.

Valor: A parada brusca justifica uma maxidesvalorização de 30% como a das últimas semanas?

Pastore: Claro que justifica. Está saindo capital do país. Se o BC não estivesse atuando, a máxi não seria de 30%, seria muito maior. Ela é só de 30% porque o BC faz leilões de linha, vende dólares à vista e vende swaps cambiais. Graças à ação ativa e correta no câmbio, o BC está evitando um stress maior.

Valor: O BC deve tentar derrubar as cotações do dólar?

Pastore: O BC tem que permitir ao câmbio real encontrar aproximadamente o novo nível de equilíbrio. Se for uma alta que leve o câmbio para algo como R$ 2,70, que hoje parece visivelmente fora do equilíbrio, aí ele pode intervir um pouco mais. Mas o BC não deve tentar intervir para deixar o dólar em R$ 1,80, algo visivelmente abaixo do equilíbrio. Se fizer isso, o mercado vai tomar todas as reservas. A intervenção tem limites.

Valor: Para chegar a esse equilíbrio, não vai haver um impacto muito grande sobre a economia real, com inflação e dificuldade para as empresas definirem preços?

Pastore: As empresas vão descobrir aos poucos, tanto quanto o BC, onde vai estar esse câmbio de equilíbrio. A economia brasileira vai ter que passar por um ajuste, e é um ajuste na direção da desaceleração do crescimento. Se nós temos que fazer um ajuste de conta corrente, de câmbio real, temos que trazer para baixo a absorção doméstica. Pelo que eu tenho visto das últimas manifestações do governo, não há disposição de cortar os gastos. De vez em quando, há uma insinuação do presidente, de que se for preciso ele corta. Mas, como o ministro da Fazenda [Guido Mantega] é keynesiano desde criancinha e prefere aumentar o gasto diante de uma restrição como essa, a redução da absorção terá que ocorrer no consumo das famílias e no investimento. Infelizmente, mais no investimento.

Valor: Por quê?

Pastore: Em primeiro lugar, porque as empresas brasileiras, para financiar os seus projetos de investimento, dependem parcialmente de crédito externo. Além disso, a FBCF é extremamente dependente das importações, e um movimento de ajuste como esse requer um ajuste nas importações. Em terceiro lugar, essa depreciação do câmbio, mesmo com todo esse ajuste de crédito que ocorre agora, produz um efeito inflacionário. Eu não sei se os juros reais vão ficar no nível atual ou vão subir, mas possivelmente terão que aumentar. Há uma dúvida sobre se a restrição de crédito já derruba a absorção na magnitude suficiente para fazer o ajuste. Eu não quero dar uma resposta peremptória, mas na modelagem que eu faço eu não chego a essa conclusão.

Valor: Diante da necessidade de um câmbio mais desvalorizada para enfrentar um cenário externo adverso, não foi um erro ter permitido a apreciação para R$ 1,55?

Pastore: O câmbio é flutuante, e o Brasil se beneficiou da valorização enquanto ela durou. O erro é pensar que o câmbio não flutuaria, tomando decisões assumindo essa hipótese. O câmbio fixo é ainda pior.

Valor: O sr. acha que a zeragem de posições das empresas que tiveram perdas em operações com derivativos tem algum peso na magnitude da alta do dólar? O governo deve ajudar essas empresas?

Pastore: Eu não preciso disso para explicar a alta do dólar. O que explica é a parada brusca do fluxo de capitais. E acho que o governo não deve ajudar ninguém.

Valor: O câmbio está acima de R$ 2, mas há uma contração de crédito e a queda de preços de commodities. O que prevalece neste momento para definir a política monetária?

Pastore: Se você perguntar para alguns economistas de peso, vários deles vão dizer que a credibilidade do BC é importante e que é necessário aumentar os juros. Eu respeito esse argumento. Mas acho que, num momento como esse, em que há uma incerteza sobre o quanto o lado da economia está sendo afetado, é melhor esperar para ver a dimensão do efeito sobre a atividade derivada da contração de crédito. Se eu estivesse no Copom, eu votaria por uma pausa, mas dizendo que há um risco inflacionário...

Valor: ...que vem basicamente do câmbio, não? Os outros fatores não são deflacionários, como a queda das commodities?

Pastore: Os preços de commodities, em reais, estão subindo. O Brasil não está num regime de câmbio fixo. Quando você multiplica os preços de commodities pelo câmbio, eles estão subindo.

Valor: O que o sr. achou da medida provisória que permite aos bancos públicos comprar participações em instituições privadas?

Pastore: Se você está numa crise de liquidez, é insano usar um instrumento de compra de ações. Os instrumentos que se usam para uma crise de liquidez são o redesconto e a liberação de compulsório. A medida foi errada. Você só edita uma medida dessas se há algum banco quebrando, e aí já faz e anuncia qual é exatamente a instituição. Com a edição da medida provisória, o mercado começou a perguntar que banco estava quebrando no Brasil. Isso gerou uma segunda onda de especulação, que levou o BC a ter que mostrar o canhão [os leilões de US$ 50 bilhões em swaps cambiais], para dizer que é capaz de fazer intervenção.

Valor: Como o sr. avalia a possibilidade de a Caixa Econômica Federal comprar ações de construtoras, por exemplo?

Pastore: Para evitar impactos maiores da crise, o Brasil deve melhorar a qualidade da política macroeconômica. Se você cortar o gasto público, ajusta a absorção, o que faz cair menos o investimento, subir menos os juros e depreciar menos o câmbio. Em vez de tomar medidas tópicas, que favorecem quem tem um lobby maior, faça uma coisa que favoreça a economia toda. Quem foi otimista demais no passado e tomou riscos não proporcionais ao que ocorre hoje vai ter que se ajustar.

Valor: Depois de uma eventual pausa no ciclo de alta dos juros, o sr. acredita que virá uma nova alta?

Pastore: Pode haver uma nova alta ou não. Se você para de aumentar os juros, é sinal de que pode haver uma desaceleração forte da atividade. Mas acho que é uma pausa para voltar a subir. Vamos fazer uma conta simples. Suponha que todo mundo que vende produtos importados ou exportáveis nunca tenha formado os preços com o câmbio de R$ 1,55, R$ 1,60, mas de R$ 1,70. Vamos considerar que o câmbio fique em R$ 2,10, e não R$ 2,30 ou R$ 2,40. Com uma alta de R$ 1,70 para R$ 2,10, em cinco ou seis meses a inflação ficaria 1,9 ponto percentual acima do nível atual, com a estimativa do repasse da depreciação permanente para os preços. Como nós estamos com uma inflação de 6,2%, ela subiria para 8,1%. Você vai jogar fora a meta de inflação, dizer que não quer? Como é que você traz de 8,1%, para 4,5% - ou para 5%, 5,5% ou 6%, sem subir os juros?

Valor: Em outubro, todos os relatos indicam que houve uma forte piora no crédito. Isso pode provocar um tranco já no quarto trimestre?

Pastore: Se essa contração de crédito persistir por três meses, a atividade econômica vem abaixo. Mas com o BC tomando ações, você pode esperar uma volta gradual do crédito. Quando o diagnóstico está certo e você administra o remédio correto, o tempo para o remédio para produzir efeito pode ser mais longo, mas ele produz o efeito.

Valor: O ministro da Fazenda vinha dizendo que a economia poderia crescer 4% a 4,5% em 2009. É muito otimismo?

Pastore: É otimismo demais. As previsões já eram de uma desaceleração antes dessa crise. Ela vai gerar um crescimento menor que 4% a 4,5%. Se é 3%, 3,5%, 2%, 2,5%, é uma outra história. O consenso de mercado antes da crise estava em 3,5%. Se for consistente, vai prever uma expansão menor que 3,5%.

terça-feira, outubro 28, 2008

Mais e mais poder

Aliança mais cara

Com vitórias nas urnas, líderes do PMDB recusam alinhamento imediato a Lula

Brasília e Porto Alegre — Fortalecidos pelos resultados das eleições municipais, dois líderes do PMDB deixaram claro ontem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrentará dificuldades para convencer o partido a apoiar um candidato do PT na próxima disputa presidencial. Em conversa com o Correio, o presidente do diretório peemedebista no estado de São Paulo, o ex-governador Orestes Quércia, declarou que o ideal para a sigla seria lançar um nome próprio na sucessão. Mas, diante da falta de um quadro reconhecido nacionalmente entre seus filiados, a opção preferencial tem de ser a adesão à possível chapa encabeçada pelo governador de São Paulo, José Serra (PSDB).

“Defendo o apoio ao Serra. O melhor caminho é a alternância de poder. Não será bom para o Brasil o PT continuar no governo”, disse Quércia. A parceria com o tucano foi colocada em prática na corrida pela prefeitura paulistana, quando os dois trabalharam pela vitória do prefeito Gilberto Kassab (DEM) sobre a petista Marta Suplicy. Reeleito em Porto Alegre depois de derrotar a deputada federal Maria do Rosário (PT), José Fogaça (PMDB) reforçou o discurso contrário ao alinhamento automático a Lula em 2010. Na primeira entrevista após a vitória de domingo, afirmou que sua legenda “não pode ficar a reboque” de ninguém nas negociações sobre as eleições presidenciais.

Estratégia
“O partido deve ser protagonista das articulações”, disse Fogaça. Para justificar a tese, lembrou que os peemedebistas conquistaram a maior quantidade de prefeituras no país. O plano do presidente Lula é lançar a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, na corrida pelo Palácio do Planalto. O posto de vice seria ocupado por um peemedebista, como o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Perguntado se considerava Dilma uma boa candidata, Fogaça respondeu que sim, mas ironizou. “Acho a ministra uma excelente candidata, mas as condições políticas são outra coisa. Eu achava a deputada Maria do Rosário uma excelente candidata e concorri contra ela. E ontem votei em mim e não nela.”

Mesmo com a rivalidade local entre PT e PMDB, o prefeito de Porto Alegre não descartou uma aliança nacional entre os dois partidos. Mas impôs condições. “Depende do protagonismo que seja dado ao PMDB e do espaço que o partido tenha na definição das propostas e programas.” O alerta foi acompanhado de uma crítica. “O PT ainda tem a cultura do partido único. Quem não entende que o Brasil é multipartidário e acredita que uma só força possa manter o poder por 20 anos ainda está vivendo no século passado”, arrematou Fogaça.

A luta por espaço entre as duas legendas é um dos principais obstáculos à aliança em 2010. Fogaça, por exemplo, planeja disputar o governo gaúcho com os petistas. O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB), cogita fazer o mesmo na Bahia, confrontando o atual governador Jaques Wagner (PT). São quedas-de-braço que, se realizadas de forma renhida, podem inviabilizar uma parceria na sucessão presidencial. Essa avaliação é feita por auxiliares de Lula. Também vale para a novela sobre a sucessão na Câmara e no Senado.

Congresso
O PT está disposto a votar no deputado federal Michel Temer (PMDB). Cobra, em contrapartida, ajuda para fazer do senador petista Tião Viana (AC) sucessor de Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN). O problema é que a bancada do PMDB no Senado resiste a selar o acordo. O grupo quer algum tipo de compensação por abrir mão da presidência do Senado, acusam os petistas. O pagamento, acrescentam, pode ser o Ministério do Turismo ou mais diretorias em estatais do setor elétrico. “Uma composição com o PMDB tem sempre um grau de dificuldade maior porque eles são uma colcha de retalho, uma confederação de interesses”, disse a líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC).

“Eles não têm unidade partidária. No caso da sucessão no Senado, disseram que têm de ter alguma contrapartida. Isso foi explicitado em jantar com o Lula”, acrescentou Ideli. Para o líder do PMDB na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), o ideal é que cada partido comande uma das Casas do Congresso, como defende o presidente da República. Alves deixou claro, no entanto, que respeitará a decisão “soberana” de seus colegas senadores. Alinhado ao Planalto, o deputado reafirmou que a maioria do PMDB quer manter a parceria com Lula em 2010.

“É lógico que num partido do tamanho do PMDB não pode haver unanimidade. A aliança com o presidente é o caminho natural, já que participamos do governo com espaços de qualidade”, disse Alves, referindo-se aos seis ministérios sob o guarda-chuva peemedebista. Entre eles Minas e Energia e Saúde.

Fonte: Correio Braziliense.

quarta-feira, outubro 15, 2008

O mérito do professor

Na Coluna TENDÊNCIAS/DEBATES da Folha de S. Paulo

* Por Maria Helena Guimarães de Castro

Pela primeira vez, funcionários estaduais receberão bônus financeiro de acordo com o resultado do trabalho

MAIS QUE escolas, escolas de qualidade. Mais que professores, professores comprometidos, motivados e valorizados. É com essas premissas que o Estado de São Paulo encara a missão de dar um salto de qualidade na educação pública. Superado o desafio da inclusão devido a fundamentais políticas de universalização do acesso em anos anteriores, o governo do Estado enfrenta o problema do baixo desempenho de seus alunos, tendo como prioridade aperfeiçoar o sistema de educação.

Como não poderia ser diferente, o Estado mostrou todos os resultados de seus alunos, a maioria apontando para problemas de aprendizagem. O problema paulista é o de todo o Brasil, mas São Paulo preparou um plano de metas de qualidade de médio e longo prazo. Diagnosticou a situação e implantou na rede de 5 milhões de alunos programas para melhorar a qualidade das aprendizagens: nova proposta curricular, materiais de apoio, programa de alfabetização, recuperação intensiva, ampla formação continuada dos professores, elevados investimentos nas 5.500 escolas.

Mas a mais importante ação é o sério compromisso do governo José Serra com a valorização dos professores, protagonistas do sistema.

Só há melhor desempenho dos alunos com professores motivados. O Estado, após aumentar o salário-base de todos os professores, selecionar 12 mil coordenadores pedagógicos e reorganizar o sistema de supervisão, lançou projeto de remuneração por desempenho que pode resultar em até 2,9 salários mensais a mais aos professores. Trata-se de reconhecer o esforço dos professores e valorizar o compromisso com a melhoria do desempenho dos alunos.

Pela primeira vez, funcionários estaduais receberão bônus financeiro de acordo com o resultado do trabalho. Outros países, como o Chile, adotaram ações semelhantes. Nos EUA, o maior sucesso ocorreu em Nova York.

No Brasil, Minas Gerais, Pernambuco e Distrito Federal começam a adotar esse tipo de incentivo. No Ceará, a cidade de Sobral tem bonificação por mérito. O modelo paulista é adaptado à nossa realidade e, por isso, acreditamos no seu sucesso.

Os cerca de 300 mil funcionários da Secretaria da Educação (professores efetivos e temporários, diretores, agentes de serviço etc.) poderão receber bônus equivalente a 2,9 salários mensais se seus alunos melhorarem a aprendizagem. As escolas terão de atingir metas ano a ano. A comparação é da escola com ela mesma. Para efeito do bônus por resultado, não há comparação entre escolas, já que cada uma tem realidade diferente.

Se as metas forem 100% alcançadas, todos os funcionários da escola receberão bônus total: 20% dos 12 salários mensais, ou seja, 2,4 salários a mais. A bonificação será equivalente ao avanço. Se a escola atingir 50% de sua meta, seus funcionários receberão 50% do bônus -1,2 salário a mais.
As escolas que superarem as metas receberão pelo esforço maior. Ao superar 20% do índice, os funcionários terão acréscimo de 20% ao bônus total. Se passar 10%, 10% a mais. O teto é de 20% a mais, 2,9 salários.

É uma política de justiça e mais eqüidade, que valoriza o trabalho conjunto da equipe da escola.
A bonificação por mérito não substitui o salário, o complementa. Salário e carreira são fundamentais, mas igualmente importante é reconhecer o bom profissional. Criar incentivos para melhorar o desempenho dos estudantes é essencial. Temos escolas com igual estrutura, no mesmo bairro e com perfil de alunos semelhante, mas com resultados muito diferentes.

A secretaria já apóia de maneira especial escolas com resultados mais insuficientes. São 379 com assistência técnica diferenciada e reformas. Mas não só essas: são R$ 700 milhões em obras nas escolas, totalizando 1.200 intervenções em 2008.

Uma política efetiva de valorização dos professores requer ações articuladas. Formação inicial e continuada, melhoria de condições de trabalho e incentivos à carreira são indispensáveis. Isonomia salarial, sozinha, não resolve os problemas da educação pública brasileira. Uma política capaz de distinguir os mais dedicados e eficientes deve ser estimulada pelo gestor público. São Paulo deu seu passo, com o maior quadro de funcionários.

Mais do que uma política de governo, uma política de Estado comprometida com o futuro de crianças e jovens.

* MARIA HELENA GUIMARÃES DE CASTRO , 62, professora da Unicamp (licenciada), é secretária da Educação do Estado de São Paulo. Foi secretária-executiva do Ministério da Educação (2002) e presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) de 1995 a 2002.

quinta-feira, setembro 25, 2008

Artigo de Antoir Mendes Santos

Os novos municípios

Passados 12 anos da promulgação da Emenda 15 que regulamentou o parágrafo 4º do Art. 18 da Constituição Federal, que disciplina as condições para a criação, fusão, incorporação e desmembramento dos municípios brasileiros, o Congresso Nacional começa a se mexer, no sentido de operacionalizar as normas estabelecidas pela emenda para frear a criação de novos municípios que, não raro, não têm a menor condição de se manter com suas próprias pernas.

Até a promulgação da Emenda 15, o processo de criação de municípios estava referido, basicamente, a decisões das assembléias estaduais, ouvida a população, mediante plebiscito. Com base nesses critérios, existiam no país em 1988 4.121 municípios: em 2000 já eram 5.559 municípios, ou seja, um acréscimo de 1.438 novos municípios, dos quais 765 tinham população inferior a 5.000 habitantes e 380 com população entre 5.000 e 10.000 habitantes. No RN, para os mesmos anos, o número de municípios saltou de 151 para 167 municípios, o equivalente a 16 novos municípios, dos quais 12 com população inferior a 5.000 habitantes e 04 entre 5 e 10.000 habitantes.

Não é preciso ser especialista para ver que a gestação de cidades tão pequenas e sem uma economia consolidada, ocasionou uma geração de municípios dependentes das transferências do governo federal, com forte participação do FPM - Fundo de Participação dos Municípios. Via de regra, a receita tributária própria desses municípios é insuficiente para sustentar os cargos políticos gerados (prefeitos, vereadores, secretários municipais e outros penduricalhos). Segundo Gomes e Macdowell (2000), “em média, municípios com menos de 10.000 habitantes geram menos de 10% de sua receita por esforço fiscal próprio”.

Neste sentido, a promulgação da Emenda 51 adicionou ao texto constitucional a exigência da elaboração de estudos de viabilidade municipal (social, urbana, ambiental, econômica, política e administrativa), que possibilitem orientar a criação de novos municípios. Tais estudos, agora, passam a ser detalhados no âmbito da Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara de Deputados, com o objetivo de regulamentá-los e permitir a operacionalizando do processo de criação de municípios. É importante lembrar que só após comprovada a viabilidade municipal é que poderão ser realizadas as consultas à população, através de plebiscito.

Do ponto de vista da viabilidade social, urbana e ambiental a nova regra proposta cria critérios regionais para o tamanho da população, contrapondo-se ao projeto anterior que estipulava que a população dos novos municípios não poderia ser inferior a 10.000 habitantes. Agora, para as regiões Norte e Centro-Oeste a população permitida será de 5.000 hab; para a região Nordeste de 10.000 hab; e para as regiões Sul e Sudeste de 15.000 habitantes. Ademais, o número de eleitores deve ser de pelo menos 40% (quarenta por cento) da estimativa de habitantes.

Com relação à viabilidade urbana, é preciso que os novos municípios tenham, em sua área urbana, pelo menos 250 edificações nas regiões Norte e Centro-Oeste; 500 no Nordeste e 750 nas regiões Sul e Sudeste, sendo que dentre os edifícios existentes deve haver disponibilidade para instalação da prefeitura, câmara de vereadores e 1/3 das secretarias a serem criadas. Além do mais, requer-se que o município tenha espaços públicos para o atendimento da população com saúde e educação, bem como sistemas de água, esgoto e coleta de lixo.

No que tange à viabilidade econômica, exigi-se uma estimativa da receita fiscal que deverá ser cotejada com uma estimativa dos custos da nova administração, incluindo-se aí os custos com servidores, cargos comissionados e instalações a serem criados.

Essa nova proposta pode ser considerada um avanço no contexto do funcionamento da administração pública municipal, sobretudo se comparada com a farra de municípios que, no passado, proliferam para atender a pressões político-partidárias e que ocasionaram uma safra de prefeitos despreparados, vereadores sem futuro e uma cesta de cargos que serviram para acomodar, inclusive, chefetes políticos desempregados. Essa medidas chegam em boa hora, vamos torcer pela sua aprovação!

Antoir Mendes Santos é economista


sábado, agosto 23, 2008

Collor se licencia para ajudar filho candidato

Pela segunda vez, o senador deixará o cargo. Agora com o objetivo de alavancar a campanha de Fernando James em Alagoas.

Oito meses depois de retornar de uma licença, o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) vai se ausentar do Senado novamente a partir de setembro. Desta vez, para se dedicar à campanha eleitoral do filho Fernando James (PTB), que disputa a prefeitura do município de Rio Largo, distante 27km de Maceió, onde o parlamentar reside. Como presidente do partido em Alagoas, Collor vai tentar alavancar a campanha do descendente que anda em baixa.

A nova licença do senador vai abrir vaga para sua segunda suplente, Ada Mello (PTB), visto que Euclides Mello (PTB), que ocupa a primeira suplência, é candidato à prefeitura do município alagoano de Marechal Deodoro. Ada deverá ficar no cargo por 90 dias.

Ada Mello é prima e braço direito do ex-presidente. Fiel escudeira, cuida das questões pessoais de Fernando Collor em Alagoas, como agenda e o pagamento de contas. Ligada a entidades religiosas e conhecida como a amiga dos padres, a nova senadora faz papel também de cabo eleitoral de Fernando Collor, cuidando das relações dele com a Igreja Católica no Estado. Discreta e de poucas palavras, a nova senadora não tem história política e nunca foi candidata.

A dedicação à família do senador rendeu a Ada Mello um processo. Em 1992, ela foi indiciada com a ex-primeira-dama Rosane Collor no desvio de recursos da extinta Legião Brasileira de Assistência (LBA). Na época do escândalo, Rosane presidia a instituição e Ada era uma das principais funcionárias. A Justiça Federal condenou as duas por superfaturamento numa licitação para compra de leite em pó.

Discreta atuação
Desde que assumiu o cargo de senador, em janeiro de 2007, Fernando Collor teve uma atuação discreta e quase imperceptível. Num gabinete distante do plenário e do movimento da Casa, o ex-presidente evitou pronunciamentos, entrevistas e pouco conversou com os colegas senadores. O único tema ao qual realmente se dedicou foi à proposta de emenda constitucional de sua autoria que institui o parlamentarismo. Apesar de ter levantado a bandeira do assunto, suas constantes ausências prejudicam a aceitação do tema, que não empolga os senadores.

A primeira licença de Collor foi pedida em 20 de agosto do ano passado. Para justificar a ausência na época, o senador disse que a agenda do Senado em 2007 não iria avaliar questões do seu interesse, como a reforma política e projetos referentes ao meio ambiente. Desta vez, as explicações serão mais políticas. Sob alegação de “tratar de problemas pessoais”, o ex-presidente da República vai fazer campanha e tentar fortalecer o seu partido em Alagoas. Tudo de olho em 2010.

Fonte: Correio Braziliense.