sábado, fevereiro 28, 2009

Sobre lobos e matilhas

Sobre ética e seu tramento pela política brasileira. O Estadão solta editorial para colecionadores.

Onde estamos mesmo?


Editorial - E Lobão ainda é ministro


Fossem outros os tempos e os homens, o senador Edison Lobão (PMDB) teria se demitido do cargo de ministro de Minas e Energia no instante mesmo em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desautorizou expressamente manobra - que, segundo informou o presidente de Furnas, Carlos Nadalutti, era orientada pelo ministro - para destituir o presidente e o diretor-financeiro da Fundação Real Grandeza, o fundo de pensão dos funcionários de Furnas e da Eletronuclear. Ao tomar conhecimento de que os funcionários das estatais organizavam protesto contra a destituição dos dois diretores do Real Grandeza e tinham o apoio de seus sindicatos, o presidente Lula convocou o ministro a seu gabinete e cobrou explicações, que obviamente não considerou satisfatórias e convincentes - tanto assim que mandou avisar aos funcionários e líderes sindicais que a programada reunião do conselho deliberativo da fundação não seria realizada. De fato, houve a reunião, mas os conselheiros se recusaram a deliberar sobre a destituição dos dois diretores.

Antes de ir ao Palácio do Planalto, o ministro Lobão, em entrevista ao jornal O Globo, afirmou que os diretores do fundo haviam alterado os estatutos para ampliar seus mandatos por um ano e concluiu com acusações para lá de pesadas: "Isso é uma bandidagem completa! (...) Esse pessoal está revoltado porque não quer perder a boca. O que eles querem é fazer uma grande safadeza."

Após a reunião com o presidente Lula, desautorizado, mas ainda ministro, Edison Lobão explicou aos jornalistas que a decisão de adiar a mudança da diretoria do fundo foi tomada para que pudessem ser examinadas com tranquilidade as "alegações" dos funcionários e da diretoria de Furnas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva interveio tarde nesse escabroso caso, mas isso se entende. Afinal, o problema só existe porque Lula loteou os cargos da administração federal entre os partidos de sua base de apoio. É bem verdade que o presidente relutou em entregar Furnas ao PMDB. Cedeu depois que o deputado Eduardo Cunha condicionou a publicação de seu relatório contrário à extinção da CPMF (o imposto do cheque) à nomeação do ex-prefeito do Rio de Janeiro Luiz Paulo Conde para a presidência da estatal.

Mas setores do PMDB nunca se conformaram em não ter recebido também a Fundação Real Grandeza, um fundo de pensão com mais de 12 mil filiados, que administra um patrimônio de R$ 6,3 bilhões. De meados de 2007 até a última quinta-feira, os esquemas fluminenses do partido fizeram três tentativas de destituir conselheiros e diretores para substituí-los por "gente de confiança". Fracassaram, no entanto, diante da decidida reação dos funcionários de Furnas e da Eletronuclear.

Os funcionários têm sobejas razões para defender seu patrimônio de interferências políticas espúrias. A Associação dos Funcionários de Furnas, por exemplo, convocou manifestações "contra atos inescrupulosos que ameaçam o patrimônio da fundação em nome de interesses políticos para a campanha eleitoral de 2010". Excesso de zelo? Pode ser. Mas o fato é que, em 2005, a CPI dos Correios encontrou provas de que a Fundação Real Grandeza foi usada para abastecer o caixa 2 que financiava o esquema do mensalão. Os efeitos desse esquema foram devastadores para o fundo de pensão dos funcionários. Seus dirigentes foram afastados pela Secretaria de Previdência Complementar, mas o fundo encerrou o exercício com um déficit de mais de R$ 50 milhões. De lá para cá, a administração do fundo, apoiada pelos funcionários, saneou as contas, mudou o perfil dos investimentos, que se tornaram mais conservadores, e, no ano passado, houve um resultado positivo de R$ 1,2 bilhão.

O ministro Edison Lobão obteve do presidente Lula, como prêmio de consolação, autorização para que a Controladoria-Geral da União faça uma auditoria nas contas da Fundação Real Grandeza. Tudo indica que a atual diretoria sairá com um atestado de boa conduta. Afinal, a última fiscalização feita pela Secretaria de Previdência Complementar constatou que no biênio 2007/2008 houve melhora na gestão do fundo de pensão.

Melhor seria auditar o comportamento da ala do PMDB que quer controlar os R$ 6,3 bilhões do fundo. Mas sobre essa gente o senador Jarbas Vasconcelos já deu seu veredicto, na já famosa entrevista à Veja.

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