quarta-feira, outubro 29, 2008

Para Pastore, crise força ajuste maior nas contas externas

A extensão e a profundidade da crise global exigem do Brasil um ajuste do déficit em conta corrente, o que requer uma desvalorização real do câmbio e uma redução do ritmo de crescimento da demanda doméstica, avalia o ex-presidente do Banco Central (BC) Affonso Celso Pastore. Para ele, o grave problema de solvência que atingiu o sistema financeiro dos Estados Unidos e da Europa provocou uma "parada brusca do fluxo de capitais", afetando "todos os mercados emergentes que, direta ou indiretamente", dependem desses recursos, como o Brasil. Essa parada explica a alta do dólar, diz. Davilym Dourado/valor

Affonso Pastore, ex-presidente do BC: empresas e BC vão descobrir aos poucos onde vai estar o câmbio de equilíbrio

Para ele, o déficit em conta corrente (as transações de bens, serviços e rendas com o exterior), na casa de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) no acumulado no ano, seria "perfeitamente financiável" em condições normais. A questão é que a situação mudou completamente. Segundo ele, os investimentos estrangeiros diretos vão diminuir, o fluxo externo para a bolsa será menor e haverá menos recursos externos para financiar projetos de investimento das empresas. "Essa redução nos fluxos de capitais produz uma depreciação do câmbio real, independentemente de onde ficarem os preços de commodities [os principais produtos exportados pelo país]."

Se as condições externas permitirem um pequeno déficit em conta corrente, ele acredita que um dólar na casa de R$ 1,90 a R$ 2 pode ser suficiente para promover o ajuste, dependendo do nível em que se estabilizarem as commodities. No entanto, se o país tiver que obter um superávit, não descarta a necessidade de um dólar acima de R$ 2,30, talvez em R$ 2,50, embora ressalte a dificuldade de fazer esse tipo de previsão neste momento.

Pastore diz que o Brasil terá de reduzir o ritmo de expansão da absorção doméstica, composta pelo consumo das famílias, o consumo do governo e a formação bruta de capital fixo (FBCF, que mede o investimento na construção civil e em máquinas e equipamentos). Para ele, a melhor resposta seria o corte das despesas do governo. "Se você cortar o gasto público, ajusta a absorção, o que faz cair menos o investimento, subir menos os juros e depreciar menos o câmbio", diz Pastore, enfatizando, porém, não acreditar que o governo seguirá essa trilha. Com isso, o ajuste terá de recair sobre o consumo das famílias e o investimento, acredita ele.

Embora aponte riscos inflacionários da alta do dólar, Pastore considera que o BC deve manter os juros estáveis na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de hoje. Para ele, é importante analisar o impacto da forte contração de crédito sobre a atividade econômica. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: Por que o impacto da crise global sobre o Brasil tem sido muito mais forte do que se imaginava?

Affonso Celso Pastore: Nós estamos na maior crise desde 1929. Isso não é uma figura de retórica. Há pessoas que ainda não perceberam a extensão dessa crise. Ela atinge o Brasil não porque o país esteja fraco. O país tem hoje fundamentos muito melhores. Ela está afetando o Brasil porque é um tsunami de grandes proporções.

Valor: O que essa crise tem de tão mais grave do que as anteriores?

Pastore: Ela não é uma crise de liquidez do sistema bancário internacional, mas de solvência. Quando os bancos estão solventes, mas ilíquidos, isso se resolve com a figura do emprestador de última instância, o banco central, que dá liquidez ao sistema. É o caso do Brasil. Nos EUA e na Europa, como há bancos insolventes, é necessário resolver o problema de solvência, o que pode ser feito de dois modos. O primeiro é deixar o sistema financeiro quebrar. Como a economia de mercado não funciona sem crédito, sem intermediação financeira, você produziria uma depressão de grandes proporções. Para evitar isso, é necessário outro tipo de estratégia. Pode ser a solução idealizada inicialmente pelo secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, em que se compram os ativos e se dá um tempo para os bancos buscarem capital. É algo possível, mas que leva um tempo enorme, além de haver dificuldades técnicas. O sistema bancário quebraria antes disso. A outra solução é a que foi adotada pelo primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown, injetando capital diretamente no sistema [depois seguida pelos EUA]. Com isso, a quebra de bancos deixou de ser um perigo na nossa frente. Mesmo assim, há um outro problema que continua a existir. O crédito tem que encolher, porque a base de capital do sistema se reduziu, em função dos prejuízos gerados pela combinação do estouro da bolha e da alavancagem que havia no sistema.

Valor: Qual o impacto desse processo sobre a economia global?

Pastore: Com menos crédito, haverá recessões se acentuando em países que já estão em recessão. A recessão na Europa vai ser provavelmente mais longa. Nos EUA, ela talvez seja mais curta, mas será bem mais profunda do que a de 2001. Nós vamos ter um processo de redução do PIB dos países industrializados, o que afeta também os mercados emergentes. Países como a China e a Índia podem segurar um pouco a desaceleração global, mas não vão impedi-la Em segundo lugar, vão cair os preços de commodities. Mas o que ocorre agora é uma parada brusca do fluxo de capitais. Talvez seja a maior que nós tenhamos visto, e a mais complicada para lidarmos.

Valor: Por quê?

Pastore: Em 2002, houve uma parada brusca do fluxo de capitais para o Brasil, mas a solução estava nas nossas mãos. O Brasil tinha uma dívida externa muito grande e amortizações que venciam em um ano maiores do que as reservas. A dívida pública era extremamente dolarizada e havia uma mudança de governo. Houve uma parada brusca que depreciou vigorosamente a taxa de câmbio, elevando a relação dívida/PIB. Nós iríamos para uma crise de grandes proporções, se não fosse a sensatez dos dois governos. Antônio Palocci começou a conversar com o ministro Pedro Malan, foi feito o acordo com o Fundo Monetário Internacional, houve a divulgação da Carta ao Povo Brasileiro. Com essas ações e as medidas que se seguiram, como o reforço da meta de superávit primário, nós começamos a sair da crise. Mas ela só dependia de nós. A crise atual é imposta de fora para dentro. Ela não começou num emergente, que recebe uma ajuda do FMI, volta a se equilibrar e o contágio desaparece. Ela atingiu o centro econômico global, os EUA e a Europa, batendo no sistema financeiro, o coração do sistema capitalista. Isso gera uma desalavancagem, o que significa redução de dívidas e do crédito. Lá no final, implica o mundo trabalhar com menos crédito, mas, no curto prazo, causa uma parada brusca de capitais. Atinge todos os emergentes que, direta ou indiretamente, dependem do fluxo de capitais. É assim que o Brasil é atingido.

Valor: Que ajustes o Brasil terá que promover?

Pastore: Vamos olhar a conta corrente. Nós estamos com um déficit que, em condições normais, seria perfeitamente financiável. Ele atinge pouco mais de US$ 20 bilhões em 12 meses. Mas, se você pegar os últimos três ou quatro meses e anualizar, está entre US$ 35 bilhões e US$ 40 bilhões. O déficit está crescendo. O aumento do déficit não seria problemático se você tivesse fluxo de capitais para financiar, mas a situação mudou.

Valor: O fluxo de capitais vai ser muito afetado daqui para frente?

Pastore: Como é que você financia a conta corrente? Não é com capital especulativo. O grosso dos ingressos de capitais no Brasil são investimentos estrangeiros diretos, que totalizaram US$ 36 bilhões nos últimos 12 meses. Uma segunda grande fonte era o investimento em bolsa. Nos IPOs [oferta pública de ações] dos últimos anos, cerca de 70% eram recursos de estrangeiros. Em terceiro lugar, há o financiamento dos investimentos das empresas. Parte é feito com o BNDES, parte com mercado de capitais, mas outra parte é feito com empréstimos externos. Depois há outros capitais de mais curto prazo, como linhas de comércio e ACCs. Há também o dinheiro que entra para comprar títulos brasileiros. Mas essa parte é pequena relativamente ao resto. Se eu digo que os EUA vão para uma recessão maior que a de 2001 e que a Europa vai ter uma recessão longa, os lucros das empresas que podiam fazer investimentos diretos vão cair. Haverá também uma redução importante do ingresso de capitais em bolsa. Para completar, haverá menos crédito e, com isso, menos empréstimos externos para as empresas fazerem investimentos. Essa redução nos fluxos de capitais produz uma depreciação do câmbio real, independentemente de onde ficarem os preços de commodities.

Valor: É possível ter alguma idéia da magnitude da depreciação que será necessária?

Pastore: Se você puder ter um pequeno déficit em conta corrente, menor que o atual, o câmbio real de equilíbrio pode ser de R$ 1,90, R$ 2, dependendo da queda dos preços de commodities. Se você tiver que ir para um equilíbrio na conta corrente, o câmbio pode ser R$ 2, R$ 2,10, R$ 2,15, R$ 2,20, dependendo, de novo, de quanto caírem as commodities. Mas, se houver uma situação hipotética em que essa parada de fluxos de capitais persiste por mais tempo e seja necessário gerar algum superávit em conta corrente, você está falando num câmbio que pode ir para cima de R$ 2,30, R$ 2,40, pode chegar a R$ 2,50. Eu estou sendo propositalmente vago, porque é impossível prever em que nível os fluxos vão se acomodar.

Valor: A parada brusca justifica uma maxidesvalorização de 30% como a das últimas semanas?

Pastore: Claro que justifica. Está saindo capital do país. Se o BC não estivesse atuando, a máxi não seria de 30%, seria muito maior. Ela é só de 30% porque o BC faz leilões de linha, vende dólares à vista e vende swaps cambiais. Graças à ação ativa e correta no câmbio, o BC está evitando um stress maior.

Valor: O BC deve tentar derrubar as cotações do dólar?

Pastore: O BC tem que permitir ao câmbio real encontrar aproximadamente o novo nível de equilíbrio. Se for uma alta que leve o câmbio para algo como R$ 2,70, que hoje parece visivelmente fora do equilíbrio, aí ele pode intervir um pouco mais. Mas o BC não deve tentar intervir para deixar o dólar em R$ 1,80, algo visivelmente abaixo do equilíbrio. Se fizer isso, o mercado vai tomar todas as reservas. A intervenção tem limites.

Valor: Para chegar a esse equilíbrio, não vai haver um impacto muito grande sobre a economia real, com inflação e dificuldade para as empresas definirem preços?

Pastore: As empresas vão descobrir aos poucos, tanto quanto o BC, onde vai estar esse câmbio de equilíbrio. A economia brasileira vai ter que passar por um ajuste, e é um ajuste na direção da desaceleração do crescimento. Se nós temos que fazer um ajuste de conta corrente, de câmbio real, temos que trazer para baixo a absorção doméstica. Pelo que eu tenho visto das últimas manifestações do governo, não há disposição de cortar os gastos. De vez em quando, há uma insinuação do presidente, de que se for preciso ele corta. Mas, como o ministro da Fazenda [Guido Mantega] é keynesiano desde criancinha e prefere aumentar o gasto diante de uma restrição como essa, a redução da absorção terá que ocorrer no consumo das famílias e no investimento. Infelizmente, mais no investimento.

Valor: Por quê?

Pastore: Em primeiro lugar, porque as empresas brasileiras, para financiar os seus projetos de investimento, dependem parcialmente de crédito externo. Além disso, a FBCF é extremamente dependente das importações, e um movimento de ajuste como esse requer um ajuste nas importações. Em terceiro lugar, essa depreciação do câmbio, mesmo com todo esse ajuste de crédito que ocorre agora, produz um efeito inflacionário. Eu não sei se os juros reais vão ficar no nível atual ou vão subir, mas possivelmente terão que aumentar. Há uma dúvida sobre se a restrição de crédito já derruba a absorção na magnitude suficiente para fazer o ajuste. Eu não quero dar uma resposta peremptória, mas na modelagem que eu faço eu não chego a essa conclusão.

Valor: Diante da necessidade de um câmbio mais desvalorizada para enfrentar um cenário externo adverso, não foi um erro ter permitido a apreciação para R$ 1,55?

Pastore: O câmbio é flutuante, e o Brasil se beneficiou da valorização enquanto ela durou. O erro é pensar que o câmbio não flutuaria, tomando decisões assumindo essa hipótese. O câmbio fixo é ainda pior.

Valor: O sr. acha que a zeragem de posições das empresas que tiveram perdas em operações com derivativos tem algum peso na magnitude da alta do dólar? O governo deve ajudar essas empresas?

Pastore: Eu não preciso disso para explicar a alta do dólar. O que explica é a parada brusca do fluxo de capitais. E acho que o governo não deve ajudar ninguém.

Valor: O câmbio está acima de R$ 2, mas há uma contração de crédito e a queda de preços de commodities. O que prevalece neste momento para definir a política monetária?

Pastore: Se você perguntar para alguns economistas de peso, vários deles vão dizer que a credibilidade do BC é importante e que é necessário aumentar os juros. Eu respeito esse argumento. Mas acho que, num momento como esse, em que há uma incerteza sobre o quanto o lado da economia está sendo afetado, é melhor esperar para ver a dimensão do efeito sobre a atividade derivada da contração de crédito. Se eu estivesse no Copom, eu votaria por uma pausa, mas dizendo que há um risco inflacionário...

Valor: ...que vem basicamente do câmbio, não? Os outros fatores não são deflacionários, como a queda das commodities?

Pastore: Os preços de commodities, em reais, estão subindo. O Brasil não está num regime de câmbio fixo. Quando você multiplica os preços de commodities pelo câmbio, eles estão subindo.

Valor: O que o sr. achou da medida provisória que permite aos bancos públicos comprar participações em instituições privadas?

Pastore: Se você está numa crise de liquidez, é insano usar um instrumento de compra de ações. Os instrumentos que se usam para uma crise de liquidez são o redesconto e a liberação de compulsório. A medida foi errada. Você só edita uma medida dessas se há algum banco quebrando, e aí já faz e anuncia qual é exatamente a instituição. Com a edição da medida provisória, o mercado começou a perguntar que banco estava quebrando no Brasil. Isso gerou uma segunda onda de especulação, que levou o BC a ter que mostrar o canhão [os leilões de US$ 50 bilhões em swaps cambiais], para dizer que é capaz de fazer intervenção.

Valor: Como o sr. avalia a possibilidade de a Caixa Econômica Federal comprar ações de construtoras, por exemplo?

Pastore: Para evitar impactos maiores da crise, o Brasil deve melhorar a qualidade da política macroeconômica. Se você cortar o gasto público, ajusta a absorção, o que faz cair menos o investimento, subir menos os juros e depreciar menos o câmbio. Em vez de tomar medidas tópicas, que favorecem quem tem um lobby maior, faça uma coisa que favoreça a economia toda. Quem foi otimista demais no passado e tomou riscos não proporcionais ao que ocorre hoje vai ter que se ajustar.

Valor: Depois de uma eventual pausa no ciclo de alta dos juros, o sr. acredita que virá uma nova alta?

Pastore: Pode haver uma nova alta ou não. Se você para de aumentar os juros, é sinal de que pode haver uma desaceleração forte da atividade. Mas acho que é uma pausa para voltar a subir. Vamos fazer uma conta simples. Suponha que todo mundo que vende produtos importados ou exportáveis nunca tenha formado os preços com o câmbio de R$ 1,55, R$ 1,60, mas de R$ 1,70. Vamos considerar que o câmbio fique em R$ 2,10, e não R$ 2,30 ou R$ 2,40. Com uma alta de R$ 1,70 para R$ 2,10, em cinco ou seis meses a inflação ficaria 1,9 ponto percentual acima do nível atual, com a estimativa do repasse da depreciação permanente para os preços. Como nós estamos com uma inflação de 6,2%, ela subiria para 8,1%. Você vai jogar fora a meta de inflação, dizer que não quer? Como é que você traz de 8,1%, para 4,5% - ou para 5%, 5,5% ou 6%, sem subir os juros?

Valor: Em outubro, todos os relatos indicam que houve uma forte piora no crédito. Isso pode provocar um tranco já no quarto trimestre?

Pastore: Se essa contração de crédito persistir por três meses, a atividade econômica vem abaixo. Mas com o BC tomando ações, você pode esperar uma volta gradual do crédito. Quando o diagnóstico está certo e você administra o remédio correto, o tempo para o remédio para produzir efeito pode ser mais longo, mas ele produz o efeito.

Valor: O ministro da Fazenda vinha dizendo que a economia poderia crescer 4% a 4,5% em 2009. É muito otimismo?

Pastore: É otimismo demais. As previsões já eram de uma desaceleração antes dessa crise. Ela vai gerar um crescimento menor que 4% a 4,5%. Se é 3%, 3,5%, 2%, 2,5%, é uma outra história. O consenso de mercado antes da crise estava em 3,5%. Se for consistente, vai prever uma expansão menor que 3,5%.

terça-feira, outubro 28, 2008

Mais e mais poder

Aliança mais cara

Com vitórias nas urnas, líderes do PMDB recusam alinhamento imediato a Lula

Brasília e Porto Alegre — Fortalecidos pelos resultados das eleições municipais, dois líderes do PMDB deixaram claro ontem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrentará dificuldades para convencer o partido a apoiar um candidato do PT na próxima disputa presidencial. Em conversa com o Correio, o presidente do diretório peemedebista no estado de São Paulo, o ex-governador Orestes Quércia, declarou que o ideal para a sigla seria lançar um nome próprio na sucessão. Mas, diante da falta de um quadro reconhecido nacionalmente entre seus filiados, a opção preferencial tem de ser a adesão à possível chapa encabeçada pelo governador de São Paulo, José Serra (PSDB).

“Defendo o apoio ao Serra. O melhor caminho é a alternância de poder. Não será bom para o Brasil o PT continuar no governo”, disse Quércia. A parceria com o tucano foi colocada em prática na corrida pela prefeitura paulistana, quando os dois trabalharam pela vitória do prefeito Gilberto Kassab (DEM) sobre a petista Marta Suplicy. Reeleito em Porto Alegre depois de derrotar a deputada federal Maria do Rosário (PT), José Fogaça (PMDB) reforçou o discurso contrário ao alinhamento automático a Lula em 2010. Na primeira entrevista após a vitória de domingo, afirmou que sua legenda “não pode ficar a reboque” de ninguém nas negociações sobre as eleições presidenciais.

Estratégia
“O partido deve ser protagonista das articulações”, disse Fogaça. Para justificar a tese, lembrou que os peemedebistas conquistaram a maior quantidade de prefeituras no país. O plano do presidente Lula é lançar a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, na corrida pelo Palácio do Planalto. O posto de vice seria ocupado por um peemedebista, como o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Perguntado se considerava Dilma uma boa candidata, Fogaça respondeu que sim, mas ironizou. “Acho a ministra uma excelente candidata, mas as condições políticas são outra coisa. Eu achava a deputada Maria do Rosário uma excelente candidata e concorri contra ela. E ontem votei em mim e não nela.”

Mesmo com a rivalidade local entre PT e PMDB, o prefeito de Porto Alegre não descartou uma aliança nacional entre os dois partidos. Mas impôs condições. “Depende do protagonismo que seja dado ao PMDB e do espaço que o partido tenha na definição das propostas e programas.” O alerta foi acompanhado de uma crítica. “O PT ainda tem a cultura do partido único. Quem não entende que o Brasil é multipartidário e acredita que uma só força possa manter o poder por 20 anos ainda está vivendo no século passado”, arrematou Fogaça.

A luta por espaço entre as duas legendas é um dos principais obstáculos à aliança em 2010. Fogaça, por exemplo, planeja disputar o governo gaúcho com os petistas. O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB), cogita fazer o mesmo na Bahia, confrontando o atual governador Jaques Wagner (PT). São quedas-de-braço que, se realizadas de forma renhida, podem inviabilizar uma parceria na sucessão presidencial. Essa avaliação é feita por auxiliares de Lula. Também vale para a novela sobre a sucessão na Câmara e no Senado.

Congresso
O PT está disposto a votar no deputado federal Michel Temer (PMDB). Cobra, em contrapartida, ajuda para fazer do senador petista Tião Viana (AC) sucessor de Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN). O problema é que a bancada do PMDB no Senado resiste a selar o acordo. O grupo quer algum tipo de compensação por abrir mão da presidência do Senado, acusam os petistas. O pagamento, acrescentam, pode ser o Ministério do Turismo ou mais diretorias em estatais do setor elétrico. “Uma composição com o PMDB tem sempre um grau de dificuldade maior porque eles são uma colcha de retalho, uma confederação de interesses”, disse a líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC).

“Eles não têm unidade partidária. No caso da sucessão no Senado, disseram que têm de ter alguma contrapartida. Isso foi explicitado em jantar com o Lula”, acrescentou Ideli. Para o líder do PMDB na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), o ideal é que cada partido comande uma das Casas do Congresso, como defende o presidente da República. Alves deixou claro, no entanto, que respeitará a decisão “soberana” de seus colegas senadores. Alinhado ao Planalto, o deputado reafirmou que a maioria do PMDB quer manter a parceria com Lula em 2010.

“É lógico que num partido do tamanho do PMDB não pode haver unanimidade. A aliança com o presidente é o caminho natural, já que participamos do governo com espaços de qualidade”, disse Alves, referindo-se aos seis ministérios sob o guarda-chuva peemedebista. Entre eles Minas e Energia e Saúde.

Fonte: Correio Braziliense.

quarta-feira, outubro 15, 2008

O mérito do professor

Na Coluna TENDÊNCIAS/DEBATES da Folha de S. Paulo

* Por Maria Helena Guimarães de Castro

Pela primeira vez, funcionários estaduais receberão bônus financeiro de acordo com o resultado do trabalho

MAIS QUE escolas, escolas de qualidade. Mais que professores, professores comprometidos, motivados e valorizados. É com essas premissas que o Estado de São Paulo encara a missão de dar um salto de qualidade na educação pública. Superado o desafio da inclusão devido a fundamentais políticas de universalização do acesso em anos anteriores, o governo do Estado enfrenta o problema do baixo desempenho de seus alunos, tendo como prioridade aperfeiçoar o sistema de educação.

Como não poderia ser diferente, o Estado mostrou todos os resultados de seus alunos, a maioria apontando para problemas de aprendizagem. O problema paulista é o de todo o Brasil, mas São Paulo preparou um plano de metas de qualidade de médio e longo prazo. Diagnosticou a situação e implantou na rede de 5 milhões de alunos programas para melhorar a qualidade das aprendizagens: nova proposta curricular, materiais de apoio, programa de alfabetização, recuperação intensiva, ampla formação continuada dos professores, elevados investimentos nas 5.500 escolas.

Mas a mais importante ação é o sério compromisso do governo José Serra com a valorização dos professores, protagonistas do sistema.

Só há melhor desempenho dos alunos com professores motivados. O Estado, após aumentar o salário-base de todos os professores, selecionar 12 mil coordenadores pedagógicos e reorganizar o sistema de supervisão, lançou projeto de remuneração por desempenho que pode resultar em até 2,9 salários mensais a mais aos professores. Trata-se de reconhecer o esforço dos professores e valorizar o compromisso com a melhoria do desempenho dos alunos.

Pela primeira vez, funcionários estaduais receberão bônus financeiro de acordo com o resultado do trabalho. Outros países, como o Chile, adotaram ações semelhantes. Nos EUA, o maior sucesso ocorreu em Nova York.

No Brasil, Minas Gerais, Pernambuco e Distrito Federal começam a adotar esse tipo de incentivo. No Ceará, a cidade de Sobral tem bonificação por mérito. O modelo paulista é adaptado à nossa realidade e, por isso, acreditamos no seu sucesso.

Os cerca de 300 mil funcionários da Secretaria da Educação (professores efetivos e temporários, diretores, agentes de serviço etc.) poderão receber bônus equivalente a 2,9 salários mensais se seus alunos melhorarem a aprendizagem. As escolas terão de atingir metas ano a ano. A comparação é da escola com ela mesma. Para efeito do bônus por resultado, não há comparação entre escolas, já que cada uma tem realidade diferente.

Se as metas forem 100% alcançadas, todos os funcionários da escola receberão bônus total: 20% dos 12 salários mensais, ou seja, 2,4 salários a mais. A bonificação será equivalente ao avanço. Se a escola atingir 50% de sua meta, seus funcionários receberão 50% do bônus -1,2 salário a mais.
As escolas que superarem as metas receberão pelo esforço maior. Ao superar 20% do índice, os funcionários terão acréscimo de 20% ao bônus total. Se passar 10%, 10% a mais. O teto é de 20% a mais, 2,9 salários.

É uma política de justiça e mais eqüidade, que valoriza o trabalho conjunto da equipe da escola.
A bonificação por mérito não substitui o salário, o complementa. Salário e carreira são fundamentais, mas igualmente importante é reconhecer o bom profissional. Criar incentivos para melhorar o desempenho dos estudantes é essencial. Temos escolas com igual estrutura, no mesmo bairro e com perfil de alunos semelhante, mas com resultados muito diferentes.

A secretaria já apóia de maneira especial escolas com resultados mais insuficientes. São 379 com assistência técnica diferenciada e reformas. Mas não só essas: são R$ 700 milhões em obras nas escolas, totalizando 1.200 intervenções em 2008.

Uma política efetiva de valorização dos professores requer ações articuladas. Formação inicial e continuada, melhoria de condições de trabalho e incentivos à carreira são indispensáveis. Isonomia salarial, sozinha, não resolve os problemas da educação pública brasileira. Uma política capaz de distinguir os mais dedicados e eficientes deve ser estimulada pelo gestor público. São Paulo deu seu passo, com o maior quadro de funcionários.

Mais do que uma política de governo, uma política de Estado comprometida com o futuro de crianças e jovens.

* MARIA HELENA GUIMARÃES DE CASTRO , 62, professora da Unicamp (licenciada), é secretária da Educação do Estado de São Paulo. Foi secretária-executiva do Ministério da Educação (2002) e presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) de 1995 a 2002.