domingo, outubro 07, 2007

Pacto pela Valorização da Floresta e pelo Fim do do Desmatamento na Amazônia

Pacto pela Valorização da Floresta e pelo Fim do

Desmatamento na Amazônia 1

Introdução

Os signatários deste documento propõem à sociedade brasileira um Pacto Nacional pela Valorização da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na Amazônia Brasileira2 a ser atingido em sete anos. Os serviços ambientais prestados pela floresta deverão beneficiar os meios de vida locais e globais, bem como apoiar o desenvolvimento regional e nacional.

Os altos índices de perda de cobertura florestal estão levando a um acelerado empobrecimento da biodiversidade, com impactos diretos no modo de vida de milhões de pessoas que dependem da floresta para sobreviver. O desmatamento

é também uma importante fonte de emissão de gases do efeito estufa, que contribui para acelerar o aquecimento global mudanças no uso do solo e desmatamentos respondem por cerca de 75% das emissões brasileiras. A floresta Amazônica desempenha papel fundamental na manutenção do equilíbrio climático regional e global e é responsável pela formação de chuvas no Sul e Sudeste do Brasil e na bacia do Prata tem, portanto, valor socioeconômico estratégico. Destruir a Amazônia poderá trazer seca prolongada para diversas regiões brasileiras e reduzir a produtividade agrícola do País, causando profundos impactos econômicos e sociais.

O desmatamento também não tem resultado em desenvolvimento econômico e melhoria da qualidade de vida para a população local. Ainda hoje, como 20 anos, a maior parte do desmatamento (70%) é resultado da conversão da floresta em pastagens extensivas. Mesmo o aumento na geração de emprego e renda, que ocorre durante os anos de desmatamento acelerado, não se sustenta já que, geralmente, é associado à exploração de madeira e cai dramaticamente após

1 Instituto Socioambiental (www.socioambiental.org), Greenpeace (www.greenpeace.org.br), Instituto Centro

de Vida (www.icv.org.br), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (www.ipam.org.br), The Nature Conservancy (www.tnc.org.br), Conservação Internacional (www.conservation.org.br), Amigos da Terra- Amazônia Brasileira (www.amazonia.org.br), IMAZON (www.imazon.org.br), e WWF-Brasil (www.wwf.org.br),

2 A presente proposta de Pacto foi elaborada de forma preliminar por um conjunto de organizações não governamentais, para subsidiar o debate por parte dos atores sociais e econômicos estratégicos da região amazônica, visando seu detalhamento e a formulação e desenvolvimento dos instrumentos para sua implementação no âmbito de uma iniciativa de alcance nacional.


a exaustão dos recursos da região. Como conseqüência, a renda per capita nas zonas já desmatadas é similar àquelas ainda florestadas.

Por isso, eliminar o desmatamento na Amazônia representa uma contribuição fundamental do País no combate às mudanças climáticas, para conservar a biodiversidade e preservar o modo de vida de povos indígenas e populações tradicionais da região.

Com este Pacto, propõe-se acabar com o desmatamento na Amazônia num prazo

de sete anos, através da adoção de um regime de metas de redução. Para se alcançar este objetivo será essencial implementar políticas de valoração econômica da floresta (pagamento por serviços ambientais, mercado de carbono, etc), além de otimizar o uso agrícola em áreas desmatadas. Ao mesmo tempo, será fundamental fortalecer a gestão florestal dos estados e a eficácia do controle

do desmatamento ilegal. O apoio econômico e técnico deverá ser garantido e direcionado aos órgãos governamentais, atores sociais responsáveis pela proteção da floresta (povos indígenas, comunidades locais, populações tradicionais, agricultores familiares) e aos produtores (florestais, empresariais e agrícolas) que assumirem estratégias de redução de desmatamento e de manutenção da floresta.

Nesse contexto, um dos principais desafios que se coloca é o de assegurar políticas públicas que incorporem a eliminação do desmatamento como benefício nos âmbitos social, ambiental e, em grande parte, econômico. É necessário ir além dos instrumentos de comando e controle, promovendo a revisão e re- orientação dos incentivos financeiros historicamente canalizados para atividades predatórias.

Detalhes técnicos, econômicos e institucionais do Pacto para pôr fim ao desmatamento e valorizar a floresta deverão ser desenvolvidos conjuntamente pelos governos estaduais amazônicos e o governo federal, representante dos produtores rurais, florestais e empresariais, organizações ambientalistas, movimentos sociais, povos indígenas e populações tradicionais amazônicas.

Pressupostos do Pacto

Para atingir seus objetivos, o Pacto tem como base os seguintes pressupostos:


1. Instrumentos normativos e econômicos que valorizem a floresta em pé a

serem destinados ao Estados, aos atores sociais responsáveis pela conservação da floresta e aos produtores rurais (pagamento por serviços ambientais).

2. Instrumentos normativos e econômicos que otimizem o uso de áreas já desmatadas (compensação florestal).

3. Fortalecimento de ações de monitoramento, controle e fiscalização

(ambiental e fundiário).

4. Estabelecimento e fortalecimento da governança florestal nas terras blicas da região.

A sustentação do Pacto está baseada no desenvolvimento de instrumentos de remuneração financeira por serviços ambientais prestados pela conservação florestal, que deverão ser destinados ao:

1. Fortalecimento da governança florestal mediante incentivos aos Estados;

2. Estabelecimento de incentivos econômicos aos atores sociais responsáveis pela conservação da floresta (povos ingenas, comunidades locais, populações tradicionais, agricultores familiares);

3. Estabelecimento de incentivos econômicos aos produtores (rurais, florestais, empresariais e agrícolas) que assumirem estratégias de redução

de desmatamento e de conservação da floresta.

Metas de redução de desmatamento

· Os participantes do Pacto propõem metas para extinguir o desmatamento

na Amazônia até 2015, resguardados os usos tradicionais da floresta, tendo como base a taxa aproximada verificada no período 2005-2006, de 14.000 quilômetros quadrados. A redução proposta é escalonada ano a ano como indicada na tabela abaixo.


Proposta de Metas 7 anos


desmatamento (ha)

desmat reduzido

Desm.05/06

1.400.000


1o ano (25%)

1.050.000

350.000

2o ano (25%)

787.500

612.500

3o ano (30%)

551.250

848.750

4o ano (40%)

330.750

1.069.250

5o ano (50%)

165.375

1.234.625

6º ano (75%)

41.345

1.358.655

7º ano(100%)

-

1.400.000

Total

3.585.902

6.873.780

Os percentuais na tabela acima se aplicam sobre a taxa de desmatamento

verificada no ano imediatamente anterior.

Regime amazônico de metas de redução

O regime de metas proposto para o fim do desmatamento na Amazônia deverá ser baseado na responsabilidade compartilhada entre os estados e a União, de modo

a balizar a aplicação dos incentivos.

Estas metas deverão seguir critérios que envolvam a relação entre:

1. A extensão territorial de cada estado;

2. O percentual de remanescente florestal existente (protegido e não protegido);

3. A área efetivamente disponível (utilizada e não utilizada);

4. O desmatamento histórico.


Para a concessão dos incentivos econômicos, deve-se considerar ainda que as metas incluam avanços concretos nos instrumentos de gestão, que fortaleçam a governança na Amazônia e contribuam para acelerar e consolidar a redução do desmatamento. Estes instrumentos de gestão devem se pautar por quatro pontos estruturantes:

1. Progressão significativa do percentual de propriedades rurais nos sistemas de licenciamento rural e ambiental;

2. Criação e consolidação de Unidades de Conservação;

3. Implantação das modalidades de assentamentos concebidas para a Amazônia (PAE, PDS e PAF)3 em conformidade com seus objetivos e implementação de programas de apoio às terras indígenas;

4. Implementação do programa de incentivos à redução dos desmatamentos.

Mecanismos Financeiros e Redução Compensada do

Desmatamento

Um dos principais mecanismos financeiros propostos pelo Pacto é a Redução Compensada do Desmatamento. Por este mecanismo, aqueles que comprovadamente empreenderem esforços para reduzir o desmatamento devem ser reconhecidos e recompensados. A Redução Compensada está baseada num principio fundamental: o custo da conservação da floresta amazônica e da eliminação do desmatamento na região deve ser compartilhado pela sociedade brasileira e pela comunidade internacional.

A compensação financeira pela redução do desmatamento destinada a um estado amazônico deverá seguir três critérios:

1. Redução efetiva do desmatamento.

2. Cumprimento das metas de redução.

3. Desempenho na implementação de ações estruturantes voltadas ao cumprimento de tais metas.

O desempenho será conferido àqueles que cumprirem a meta em prazo menor do que o estipulado ou que tal cumprimento esteja associado à implementação

3 PAE-Projeto Agro-Extrativista, PDS-Projeto de Desenvolvimento Sustentável e PAF-Projeto Agro- Florestal.


efetiva de mecanismos de gestão indicados pelos pressupostos estabelecidos pelo Pacto. Neste caso a compensação financeira será diferenciada, isto é, superior em relação àqueles com baixo desempenho (cumpriu a meta, mas sem implementar mecanismos de gestão; reduziu o desmatamento, mas sem que as metas previamente estabelecidas fossem atingidas; e cumpriu a meta, implementando ações estruturantes). Desta forma, cumprir integralmente a meta implicará em benefícios econômicos adicionais. Portanto, a meta poderá ser utilizada como um parâmetro de planejamento das ações e de avaliação de resultados. Cabe ressaltar que o seu não cumprimento não exclui, necessariamente, a possibilidade de obtenção de benefícios. Somente no caso de aumento do desmatamento, estes benefícios seriam suspensos.

Fundo Amazônico para pagamento por serviços ambientais

Para o período de compromisso sugerido (sete anos), estimou-se a demanda de investimentos da ordem de R$ 1 bilhão/ano em recursos públicos e privados, de acordo com uma cesta diversificada de fontes identificadas no estudo “Fundamentos Econômicos do Pacto pela Valorização da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na Amazônia” (em anexo), elaborado por um grupo de renomados economistas4. O documento parte de duas premissas: a primeira é que o País deseja atrair recursos externos para programas de preservação da floresta Amazônica, mas não abre mão de manter intacta a sua soberania sobre a área. A segunda é que o Brasil está definido como um país de renda média pelos Organismos Financeiros Internacionais, o que dificulta o recebimento pelo País de recursos subsidiados e doações desses organismos, com exceção, talvez, para a floresta tropical.

A matriz de financiamento do Pacto deve repousar em recursos públicos. Aos governos da União e dos Estados da Amazônia Legal cabem, portanto, mostrar forte comprometimento com a proposta, de forma a atrair recursos internos e externos adicionais. Todo o valor correspondente ao benefício econômico a ser destinado aos estados e aos atores sociais deverá ser gerido por um Fundo de Doações para a Conservação da Floresta Amazônica ou Fundo Amazônico de

4 O estudo econômico foi elaborado pela Consultoria Macrotempo e subsidiou as proposições apresentadas pelas organizações signatárias neste documento. Fizeram parte da equipe de consultores os seguintes economistas: Amir Khair, Carlos Eduardo Frickmann Young, Luis Afonso Simoens e Vivian Macknight.


Governança, vinculado ao desenvolvimento das ações do Pacto. O estudo também recomenda que este Fundo esteja abrigado no âmbito do BNDES (Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), que goza de prestígio elevado

no País e no exterior, o que poderia também lhe atribuir o papel de aportar recursos próprios e de catalisar recursos privados internos e externos para a região.

O Fundo visaria:

1. O fortalecimento da gestão florestal;

2. O pagamento por serviços ambientais (PSA) voltados para:

· Implementação e gestão de Unidades de Conservação;

· Programas de desenvolvimento socioambiental em Terras Indígenas

e territórios de populações tradicionais;

· Programas de apoio ao desenvolvimento rural sustentável.

O estudo também apresenta duas outras sugestões de Fundos de Investimento que podem ser estruturados com o propósito de incentivar economicamente a proteção da Floresta Amazônica.

A constituição dos três fundos, conforme indicado pelos economistas, se faria com capitais públicos e privados. Os privados, provenientes principalmente de recursos externos (mercado de carbono), de grandes empresas nacionais e outros investidores (sobretudo, os institucionais); e os públicos, advindos de dotações do Orçamento Geral da União (OGU). O aumento da destinação de recursos do OGU para a proteção do meio ambiente, comprometendo fração minúscula do seu todo,

é possível em razão de que todas as estimativas para o futuro próximo apontam para uma maior folga orçamentária, em razão do crescimento econômico e do aumento das receitas, conjugado com a redução das despesas em decorrência da queda nas taxas reais de juros.

Por fim, o estudo também aponta a possibilidade dos estados da Amazônia destinarem recursos para o financiamento do Pacto, por exemplo, por meio da criação de uma nova CIDE-Ambiental (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico-Ambiental), que incidisse em todo o País sobre atividades poluidoras e que privilegiasse os estados da região na distribuição dos recursos por ela arrecadados, ou por meio da redistribuição dos recursos do ICMS.


Com isso, o Pacto pretende conseguir um compromisso firme das Autoridades Públicas e do BNDES, que propicie a atração de recursos de investidores e doadores nacionais e internacionais, sejam eles privados, sejam oficiais (Organismos), sejam de governos (bilaterais). É importante também notar que a organização proposta para os recursos blicos respeita as atribuições legais. Em relação aos recursos privados, a proposta permite que o Estado mantenha a gestão pública sobre a aplicação destes recursos e que personalidades brasileiras

de renome internacional na área ambiental participem dos Conselhos de

Administração dos fundos a serem criados.

Considerações finais

As oportunidades de investimentos orçamentários e extra-orçamentários para um programa de escala que ofereça incentivos para a valorização da floresta depende

da capacidade de planejamento e de avaliação de desempenho.

A aplicação do mecanismo da compensação de reservas legais objetivando a resolução de passivos e a manutenção de ativos florestais é indispensável para alcançar os objetivos desse Pacto. É fundamental também que seja desenvolvido método confiável de monitoramento do deslocamento (vazamento ou leakage, em inglês) do desmatamento para outras regiões dentro ou próximo ao bioma, principalmente para o Cerrado.

Um amplo debate nacional em torno de soluções consistentes e de longo prazo para os desmatamentos na Amazônia deve ser feito com urgência. As organizações da sociedade civil apostam no amadurecimento dos diversos segmentos da sociedade brasileira e no interesse de todos em garantir ao Brasil

as condições fundamentais para o enfrentamento da crise ambiental mundial, de modo coerente com as possibilidades de desenvolvimento efetivamente sustentável para o País.

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